Inteligência artificial no processo da contratação pública

Contratação PúblicaPlanejamento

RESUMO

A Administração Pública tem dever legal e constitucional de inovação. Tal significa que adotar objetos, produtos, sistemas, técnicas ou tecnologias inovadoras é uma ação mandada para os agentes públicos, em especial para aqueles que integram a alta administração dos órgãos e entidades. Ainda que se considerem eventuais falhas ou imprecisões de resultados, a utilização da inteligência artificial tem a potencialidade concreta de assegurar ganhos de eficiência, mais celeridade, segurança jurídica e diminuição dos riscos que podem comprometer os processos de contratação pública.

ABSTRACT

The Public Administration has a legal and constitutional duty to innovate. This means that adopting innovative objects, products, systems, techniques, or technologies is a mandated action for public agents, particularly those in the senior management of agencies and entities. Even when considering potential flaws or inaccuracies in results, the use of artificial intelligence holds tangible potential to ensure efficiency gains, increased speed, legal certainty, and a reduction in risks that could compromise public procurement processes.

SUMÁRIO: 1. Introdução 2. Breves considerações sobre inteligência artificial 3. Dever de inovação e responsabilidade por omissão própria 4. Gestão de informações pela Administração Pública 5. Inteligência artificial nas contratações públicas em concreto 5.1 Avaliações de integridade de pessoas e de processos 5.2 Estruturas e processos de controle interno 5.3 Estruturas e processos de gestão de riscos 5.4 Inteligência artificial na etapa preparatória do processo da contratação pública 5.4.1 Motivação das decisões 5.4.2 Redação de textos 5.4.3 Comparação analítica e crítica de documentos 5.4.4 Sugestões de requisitos de habilitação técnica ou habilitação econômico-financeira 5.4.5 Soluções disponíveis no mercado 5.4.6 Elaboração de orçamento estimativo 5.5 Inteligência artificial na etapa de seleção do fornecedor ou prestados 5.5.1 Análise de documentos de habilitação técnica ou de habilitação econômico-financeira 5.6 Inteligência artificial na fase de execução dos contratos 5.6.1 Avaliação de desempenho contratual 5.6.2 Recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato 5.6.3 Comprovação do cumprimento do encargo contratual 6. Conclusões 7. Referências

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1. INTRODUÇÃO

O Estado brasileiro investe algo em torno de 10% a 15% do produto interno bruto (PIB) com contratações de bens, serviços, obras e congêneres. Valores substanciais e expressivos aportados para celebrar contratos que tem evidente natureza instrumental e funcional, vez que se prestam a assegurar o cumprimento das missões constitucionais impostas para a Administração Pública. Em outros termos, sem exceção, as atividades estatais são dependentes e estruturadas em contratos celebrados com terceiros particulares, agentes econômicos que se prestam a atender necessidades administrativas que podem ser satisfeitas pela via contratual.

A magnitude da importância dos contratos celebrados pela Administração Pública – em sua ampla acepção normativa – implica dever jurídico fundamental também imposto aos agentes públicos: o dever de garantir a excelência e eficiência das contratações.

Para tanto, se impõe a utilização de todos os meios e instrumentos materiais e jurídicos que se encontram à disposição, dentre eles, o uso da inteligência artificial.

Figura de ficção científica há poucos anos, a inteligência artificial se incorporou de modo definitivo no cotidiano social, seja no plano privado, seja no plano da Administração Pública. É impensável um mundo sem o uso da inteligência artificial, tamanha a assimilação desta ferramenta pela sociedade.

Diversos usos de inteligência artificial rotineiros podem ser apontados, como: (i) assistentes virtuais, como Siri, Alexa, Google Assistente; (ii) plataformas de streaming (Netflix e outras), redes sociais, sistemas de comércio eletrônico (e-commerce); (iii) aplicativos para orientação de trânsito (google maps e waze); (iv) estruturas de smartcities; (v) controle de tráfego de veículos; (vi) segurança pública; (vii) mecanismos de segurança digital; (vii) diagnósticos por imagem, entre tantos outros.

Dia a dia surgem novas aplicações para a inteligência artificial, em todos os segmentos e áreas de interesse da sociedade e da inteligência humana.

Nesta medida, se pode dizer indesculpável para a alta administração e para os agentes públicos envolvidos no processo da contratação – sob o prisma jurídico – (i) não reconhecer a importância deste instrumento de técnica e de tecnologia; (ii) não conhecer os fundamentos básicos de seu funcionamento; (iii) não adotar condutas administrativa voltadas à aplicação de inteligência artificial nos processos de contratação pública, diante de suas tamanhas possibilidades técnicas.

O texto objetiva avaliar, em razão das possibilidades efetivas e concretas contemporâneas, a potencialidade de uso de inteligência artificial nos processos de contratação pública, objetivando ampliar a celeridade, a eficiência e a sustentabilidade das contratações celebradas pela Administração Pública, com redução significativa dos riscos envolvidos neste processo, de modo a conferir maior segurança jurídica para os agentes públicos encarregados das funções essenciais a ele relacionadas.

2. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

Inteligência artificial não tem um conceito específico, pois é mais uma noção abstrata que engloba outras noções. Numa aproximação conceitual que pode ser útil, inteligência artificial “tenta induzir uma máquina, normalmente um computador, a se comportar de formas que os humanos considerem inteligentes. O termo foi inventado na década de 1950 pelo proeminente cientista da computação John McCarthy (1927-2011)[1]. Uma estrutura de inteligência artificial busca ser similar a uma estrutura de inteligência humana, capaz de utilizar experiências para formação de aprendizado, reconhecer e adotar padrões – de linguagem, de dados ou de conduta, por exemplo – e a partir deste aprendizado formar capacidades para elaboração de textos, resolução de problemas, tomada de decisões, entre outras condutas típicas da natureza humana.

Sobre aspectos estruturantes da inteligência artificial é de se destacar a posição de Fabio G. Cozmans e Hugo Neri:

Parece muito mais produtivo organizar a área de IA em torno de três eixos já mencionados em nossa discussão sobre a definição de IA: representação de conhecimento; tomada de decisão; aprendizado. Esses três eixos se relacionam a respeitáveis campos do saber humano. Representação de conhecimento é domínio da epistemologia; raciocínio é central em lógica. De forma similar, tomada de decisão é tópico basilar em campos como psicologia, economia, engenharia e direito; aprendizado de máquina trata de assuntos caros à pedagogia, mas também de técnicas estatísticas para processamento de dados[2].

Para que a inteligência artificial execute de modo eficiente e eficaz as tarefas que lhe forem designadas é preciso que seja submetida a um processo constante de aprendizado e treinamento.

Não é o propósito do texto abordar a inteligência artificial a partir de suas nuances e complexidades técnicas, mas apenas no limite do necessário para compreender seu funcionamento, de modo a possibilitar a análise de potencialidade de sua utilização concreta.

Um conceito essencial para compreender o tema é o de machine learning. Machine Learning “é uma disciplina da área da Inteligência Artificial que, por meio de algoritmos, dá aos computadores a capacidade de identificar padrões em dados massivos e fazer previsões (análise preditiva). Essa aprendizagem permite que os computadores efetuem tarefas específicas de forma autônoma, ou seja, sem necessidade de serem programados”[3].

Machine learning é

a ciência do desenvolvimento de algoritmos e modelos estatísticos que os sistemas de computador usam para realizar tarefas sem instruções explícitas, confiando em padrões e inferências. Os sistemas de computador usam algoritmos de machine learning para processar grandes quantidades de dados históricos e identificar padrões de dados. Isso permite que eles prevejam resultados com mais precisão com base em um determinado conjunto de dados de entrada. Por exemplo, os cientistas de dados podem treinar uma aplicação médica para diagnosticar câncer com base em imagens de raios-x, armazenando milhões de imagens digitalizadas e os diagnósticos correspondentes[4].

Outro conceito elementar para a compreensão do tema é o de algoritmo. Algoritmo “é uma sequência de passos lógicos utilizados para solucionar um problema. Funciona como um plano de ação, no qual cada etapa é seguida cuidadosamente para alcançar o resultado desejado”… “a estrutura de um algoritmo se divide em três componentes principais: entrada, processamento e saída. Cada uma dessas partes desempenha um papel crucial no funcionamento do algoritmo, garantindo que ele possa receber dados, manipulá-los de acordo com as instruções definidas e, finalmente, produzir um resultado útil”[5].

O processo de machine learning ocorre por intermédio dos denominados algoritmos de aprendizagem de máquina, que se enquadram, em geral, em uma destas categorias:

Aprendizado supervisionado

No aprendizado supervisionado, os algoritmos fazem previsões com base em um conjunto de exemplos rotulados fornecidos por você. Essa técnica é útil quando você sabe como deve ser a aparência do resultado.

Por exemplo, você fornece um conjunto de dados que inclui populações de cidades por ano dos últimos 100 anos e deseja saber qual será a população de uma cidade específica daqui a quatro anos. O resultado usa rótulos que já existem no conjunto de dados: população, cidade e ano.

Aprendizado não supervisionado

No aprendizado não supervisionado, os pontos de dados não são rotulados – o algoritmo os rotula para você organizando os dados ou descrevendo a estrutura deles. Essa técnica é útil quando você não sabe como deve ser a aparência do resultado.

Por exemplo, você fornece dados do cliente e deseja criar segmentos de clientes que gostam de produtos semelhantes. Os dados que você está fornecendo não são rotulados e os rótulos no resultado são gerados com base nas semelhanças que foram descobertas entre os pontos de dados.

Aprendizado de reforço

O aprendizado de reforço usa algoritmos que aprendem com os resultados e decidem qual ação será executada em seguida. Após cada ação, o algoritmo recebe comentários que o ajudam a determinar se a escolha feita foi correta, neutra ou incorreta. É uma boa técnica a ser usada para sistemas automatizados que precisam tomar muitas decisões simples sem diretrizes humanas[6].

Um bom exemplo de algoritmo de machine learning é dado por Ronald T. Kneusel:

1. Coletamos um conjunto de dados de treinamento, composto de uma coleção de entradas para o modelo e as saídas que esperamos que o modelo gere para estas entradas;7

2. Selecionamos o tipo de modelo que queremos treinar;

3. Treinamos o modelo apresentando as entradas de treinamento e ajustamos seus parâmetros quando ele obtiver as saídas erradas;

3. Repetimos a etapa 3 ate ficarmos satisfeitos com o desempenho do modelo;

4. Usamos o modelo recém-treinado a fim de gerar as saídas para as entradas novas e desconhecidas.

Boa parte dos modelos de machine learning se baseia nesse algoritmo. Como estamos usando dados rotulados conhecidos para treinar o modelo, chamamos esta abordagem de aprendizado supervisionado[7].

O machine learning é conceito e operacionalidade anterior à criação das inteligências artificiais. A criação da inteligência artificial propiciou ganhos de eficiência e celeridade para o processo de treinamento de máquina, que pode incrementado por intermédio de um modelo de inteligencia artificial baseado em linguagem natural. O Chatgpt da OpenAI é um modelo orientado para o machine learning, por exemplo.

As instruções para orientar e efetivar o treinamento de máquina ou machine learning, por intermédio de um modelo de inteligência artificial são dadas pelos denominados prompts. Um prompt “é a entrada que o usuário fornece ao modelo de inteligência artificial para gerar uma resposta desejada. A forma como essa instrução é estruturada influencia diretamente a qualidade, relevância e precisão da resposta”[8].

Em apertada síntese, para os fins desta análise estrita:

(i) uma inteligência artificial é a capacidade de uma máquina de reproduzir aptidões e competências humanas, por intermédio de processo de permanente aprendizado, destinada a oferecer respostas a questionamentos formulados, resolver problemas que lhes sejam submetidos, apresentar informações sobre temas objeto de consultas, entre outras funções;

(ii) o machine learning, indispensável para a eficiente estruturação da inteligência artificial, ocorre por intermédio de algoritmos de aprendizagem de máquina;

(iii) os algoritmos de aprendizagem de máquina são desenvolvidos a partir de informações e dados inseridos em um sistema modelo de inteligência artificial baseado em linguagem natural; (iv) as instruções para operacionalizar o machine learning e desenvolver algoritmos são dadas por meio de prompts;

(v) os prompts são o conjunto de informações dadas pelo interessado nas saídas do processo de machine learning e resultados pretendidos pelo uso da inteligência artificial;

(vi) o treinamento de máquina é fundamental para a obtenção de saídas (resultados) de melhor qualidade e confiabilidade.

3. DEVER DE INOVAÇÃO E RESPONSABILIDADE POR OMISSÃO PRÓPRIA

Um dos princípios que regem a Administração Pública é o princípio da eficiência, conceito jurídico indeterminado, dotado da abertura semântica e teleológica que lhe confere o ordenamento jurídico. Esta indeterminação tende a desaparecer quando da aplicação, em concreto, da norma principiológica. Em outros termos, eficiência é um princípio dotado de concretude e efetividade quando da sua aplicação empírica. Na análise empírica, eficiência é princípio multifacetado e multidimensional. Pode-se referir à eficiência quando um resultado pretendido é alcançado mediante cumprimento de desideratos e propósitos constitucionais de natureza econômica, processual, temporal, envolvendo a sustentabilidade, incluída nesta noção a consideração do ciclo de vida de produto ou serviço. De igual sorte, se pode referir à eficiência na medida da proporcionalidade e da melhor relação custo benefício.

Uma das matizes da eficiência é a adoção de instrumentos, técnicas ou tecnologias inovadoras. Inovação é processo pelo qual ocorre a criação de algo novo – serviço, produto, serviço, atividade – ou a implementação de algo já existente, mas que ainda não é utilizado.

Na dicção da Lei nº 10.973/2004, inovação é “introdução de novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo e social que resulte em novos produtos, serviços ou processos ou que compreenda a agregação de novas funcionalidades ou características a produto, serviço ou processo já existente que possa resultar em melhorias e em efetivo ganho de qualidade ou desempenho (art. 2º, IV).

Nem toda a inovação é positiva, benéfica ou com potencialidade de produzir resultados benéficos ou mais eficientes, pois é evidente que existem objetos inovadores que podem produzir resultados, qualquer seja a natureza deles, menos benéficos ou mais prejudiciais do que aqueles que vinham sendo utilizados.

Assim, este dever de inovação, corolário do princípio da eficiência, pressupõe a análise prévia do objeto de inovação, para aferir acerca de sua efetiva potencialidade de aumento de ganhos de eficiência.

Nesta medida, se pode referir a um dever de avaliação dos instrumentos, serviços, produtos, sistemas ou congêneres inovadores, para concluir sobre sua efetiva potencialidade de geração de ganhos de eficiência no âmbito da Administração Pública.

Caso a conclusão seja no sentido de que o objeto inovador tem potencialidade ou efetividade para assegurar ganhos de eficiência, devem ser adotados, desde que, por óbvio (i) estejam disponíveis livremente no mercado; (ii) a preços acessíveis e justificáveis em relação de proporcionalidade com os ganhos de eficiência pretendidos, e (iii) com riscos também aceitáveis, especialmente os de natureza ambiental – análise a ser feita na perspectiva dos princípios ambientais da precaução e da prevenção.

O dever de inovação, nas balizas antes indicadas, tem natureza constitucional. Assim dispõe o art. 23 da Constituição Federal que preceitua que o fomento à inovação é de competência comum entre os entes federados:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

V – proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação, à ciência, à tecnologia, à pesquisa e à inovação;

Confira-se também o disposto nos seguintes artigos da Constituição Federal:

Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:

V – incrementar, em sua área de atuação, o desenvolvimento científico e tecnológico e a inovação;

Art. 213. Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que:

§ 2º As atividades de pesquisa, de extensão e de estímulo e fomento à inovação realizadas por universidades e/ou por instituições de educação profissional e tecnológica poderão receber apoio financeiro do Poder Público.

Art. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação científica e tecnológica e a inovação.

Art. 219. O mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei federal.

Parágrafo único. O Estado estimulará a formação e o fortalecimento da inovação nas empresas, bem como nos demais entes, públicos ou privados, a constituição e a manutenção de parques e polos tecnológicos e de demais ambientes promotores da inovação, a atuação dos inventores independentes e a criação, absorção, difusão e transferência de tecnologia.

Art. 219-A. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão firmar instrumentos de cooperação com órgãos e entidades públicos e com entidades privadas, inclusive para o compartilhamento de recursos humanos especializados e capacidade instalada, para a execução de projetos de pesquisa, de desenvolvimento científico e tecnológico e de inovação, mediante contrapartida financeira ou não financeira assumida pelo ente beneficiário, na forma da lei.

Este dever de inovação é também determinado em normas infraconstitucionais:

Lei nº 10.973/04

Art. 1º Esta Lei estabelece medidas de incentivo à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo, com vistas à capacitação tecnológica, ao alcance da autonomia tecnológica e ao desenvolvimento do sistema produtivo nacional e regional do País, nos termos dos arts. 23, 24, 167, 200, 213, 218, 219 e 219-A da Constituição Federal.

Parágrafo único. As medidas às quais se refere o caput deverão observar os seguintes princípios:

I – promoção das atividades científicas e tecnológicas como estratégicas para o desenvolvimento econômico e social;

II – promoção e continuidade dos processos de desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação, assegurados os recursos humanos, econômicos e financeiros para tal finalidade;

VI – estímulo à atividade de inovação nas Instituições Científica, Tecnológica e de Inovação (ICTs) e nas empresas, inclusive para a atração, a constituição e a instalação de centros de pesquisa, desenvolvimento e inovação e de parques e polos tecnológicos no País;

VIII – incentivo à constituição de ambientes favoráveis à inovação e às atividades de transferência de tecnologia;

IX – promoção e continuidade dos processos de formação e capacitação científica e tecnológica;

XIII – utilização do poder de compra do Estado para fomento à inovação;

Lei nº 14.133/21

Art. 11. O processo licitatório tem por objetivos:

IV – incentivar a inovação e o desenvolvimento nacional sustentável.

Lei nº 8987/95

Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.

§ 1º Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.

§ 2º A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço.

Há, com natureza constitucional e legal, o dever de inovação por parte da Administração Pública. Neste plano, a inteligência artificial se enquadra na noção de objeto inovador, que deve ter o uso no mínimo avaliado pela Administração Pública.

Esta constatação tem repercussões jurídicas no plano da responsabilidade por omissão própria. A omissão própria se caracteriza pela falta de adoção de uma determinada conduta que é determinada por Lei ou pela Constituição, quando poderia ser adotada, ou seja, sem que exista causa legítima de justificação para a inação.

Desta feita, caso a excelência e a eficiência ótima administrativas não sejam alcançadas, sob qualquer prisma, em razão da falta de utilização de inteligência artificial (como por exemplo: controle e marcação de atendimentos hospitalares ou médicos; controle de tráfego, elaboração de projetos, entre outros) aquele agente da conduta omissiva é passível de responsabilização pessoal, nos termos do disposto no art. 28 do Decreto-Lei nº 4657/42.

4. GESTÃO DE INFORMAÇÕES PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Fundamentalmente a inteligência artificial opera buscando e processando dados e informações. Estes dados e informações são coletados (pesquisados) mediante processos exógenos ou mediante processos endógenos.

Os processos exógenos de busca de dados e informações se dão em bases ou repositórios de dados estranhos e alheios à estrutura operacional da Administração. Por exemplo, pesquisas em sítios eletrônicos, repositórios públicos de dados e informações, acessíveis mediante uso da internet.

Já os processos endógenos de busca de dados e informações se dão em bases ou repositórios específicos, integrantes da estrutura orgânica e funcional da Administração. Por exemplo: data centers ou arquivos de computador.

No que diz respeito às bases e repositórios de dados e informações sob controle específico da Administração, usualmente contém informações armazenadas de modo assistêmico, desestruturado e desorganizado. Exemplo clássico é o caso de organizações públicas em que informações relevantes são segregadas por órgãos públicos distintos, sem qualquer compartilhamento sistêmico e estruturado.

No plano ideal, os dados e informações produzidos pela Administração devem ser posicionados ou armazenados de modo sistêmico, organizado e estruturado, para facilitação de consulta e utilização. Há, disponíveis, sistemas eficientes para repositório e gerenciamento de informações e dados, como:

1. Data Lake: “O Data Lake pode ser definido como armazenamento centralizado, consolidado e persistente de dados brutos, não modelados e não transformados de múltiplas fontes, sem um esquema pré-definido explícito e sem metadados definidos externamente. Os dados de um DL podem ser estruturados como por exemplo dados de uma tabela em um modelo relacional, como também dados não estruturados como imagens, áudio, arquivos de texto e vídeos”[9].

2. Data Warehouse: “é um banco de dados com informações integradas através da coleção de um ou mais sistemas que se tornam a base para a tomada de decisões. Um projeto em DW permite a obtenção de dados (informações) gerenciais a partir de um grande volume de dados operacionais”[10].

A utilização efetiva destes sistemas de armazenamento de dados, entre outras vantagens, produz a possibilidade de treinamento de máquina a partir de informações limitadas e mais ajustadas aos resultados pretendidos (a base de pesquisa da inteligência artificial para o processamento e elaboração de saídas é mais restrita e qualificada).

5. INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NAS CONTRATAÇÕES PÚBLICAS EM CONCRETO

O uso da inteligência artificial nos processos de contratação publica já é uma realidade para inúmeros órgãos da Administração Pública[11]. Mas no plano geral ainda é bastante incipiente sua utilização.

De acordo com a estrutura de funcionamento da inteligência artificial, antes referida em síntese, pode ser realizado processo de aprendizagem de máquina (machine learning) por meio de modelos disponíveis no mercado, como o Chatgpt da OpenAI, para que sejam designadas tarefas objetivas que podem ampliar de modo significativo a eficiência dos processos de contratação pública.

Ressalva indispensável é de que as saídas (resultados produzidos) produzidas pela inteligência artificial tem graus de confiabilidade variáveis, o que se pode denominar de riscos de produção de inteligência artificial. Os algoritmos de machine learning são produzidos a partir de entradas (informações e dados) oferecidas pelo usuário do sistema. As saídas (produtos, informações ou soluções) são produzidas de acordo com a base de dados objeto de pesquisa pelo próprio modelo de inteligência artificial. Estas saídas nem sempre, como relatam em geral os especialistas, são confiáveis, demandando uma conferência detalhada e precisa, para que se evite o uso de resultados incorretos, o que pode gerar prejuízos para o interesse público.

Como visto, a qualidade das saídas de inteligência artificial é diretamente proporcional à qualidade dos prompt apresentados pelo usuário. Um prompt elaborado com a precisão e com a qualidade adequadas implica que o modelo de inteligência artificial realizará a busca e o processamento de dados com melhor adequação técnica, e, portanto, com potencialidade de resultados de melhor qualidade e confiabilidade.

A inteligência artificial opera, como visto, a partir de treinamento de máquina para a produção de certos resultados pretendidos (relatórios, avaliações, decisões, soluções, entre outros). Como também visto, os prompt (informações e instruções oferecidas pelo usuários ao modelo de inteligência artificial) qualificados são indispensáveis para obter resultados de qualidade e confiabilidade.

A partir de prompts qualificados, a inteligência artificial constrói saídas (resultados) por intermédio de busca em bases de dados (endógenas e exógenas, a depender da programação feita) e processo dinâmico e permanente de treinamento de máquina (machine learning).

Para a obtenção, em concreto, de resultados confiáveis, de qualidade e úteis é fundamental que os agentes públicos estejam minimamente capacitados para as técnicas e particularidades do uso da inteligência artificial, e, de preferência, a Administração conte com repositórios endógenos de informações e dados para garantir o processamento adequado e as saídas mais úteis e qualificadas.

Em concreto, se pode referir a algumas utilizações de inteligência artificial nos processos de contratação:

5.1 AVALIAÇÕES DE INTEGRIDADE DE PESSOAS E DE PROCESSOS:

Um dos objetivos do processo da contratação é assegurar a justa competição. Tal objetivo implica dever de garantia de um ambiente competitivo íntegro e confiável, com a adoção de condutas destinadas a prevenir e reduzir riscos de integridade (atos desonestos que possam violar a livre concorrência e o princípio licitatório). A inteligência artificial pode avaliar e processar dados e informações acerca de histórico de participações de pessoas físicas ou jurídicas em relações jurídico-contratuais com a Administração Pública, ou contidos em cadastros públicos de registro de aplicação de sanções que impeçam a participação em licitações e contratações públicas, inclusive para identificação de ocorrência impeditiva indireta que autorize a desconsideração da personalidade jurídica e possibilite o afastamento de certa pessoa (física ou jurídica) de processo licitatório ou de contratação direta. A inteligência artificial pode também ser treinada para o relevante e fundamental “due diligence de integridade” destinado à adoção de medidas de tratamento de riscos de integridade que possam comprometer a justa competição e condutas lesivas à Administração Públicas e aos elevados valores constitucionais que a regem.

5.2 ESTRUTURAS E PROCESSOS DE CONTROLE INTERNO:

A inteligência artificial, a partir de base de dados endógena, e com lastro em bases de dados externas (material disponível na internet, inclusive precedentes jurisprudenciais de Tribunais de Contas, órgãos centrais de controle interno, normas de controle interno, entre outros) pode avaliar procedimentos e fluxos processuais históricos para realizar saídas que podem estruturar ou aperfeiçoar sistemas de controle interno existentes.

5.3 ESTRUTURAS E PROCESSOS DE GESTÃO DE RISCOS:

A Lei nº 4.133/21 determina, no art. 18, que a fase preparatória do processo licitatório é caracterizada pelo planejamento e deve abordar todas as considerações técnicas, mercadológicas e de gestão que podem interferir na contratação, em especial, a análise dos riscos que possam comprometer o sucesso da licitação e a boa execução contratual. O processo de gerenciamento envolve a identificação, avaliação (nas perspectivas de probabilidade e impacto), o tratamento dos riscos que podem comprometer a licitação e a contratação; e as medidas de contingência que devem ser adotadas em relação aos riscos que permanecerem inaceitáveis mesmo após o tratamento. Com base em dados e informações históricas, relatórios de controle interno e de gestão e fiscalização dos contratos, a inteligência artificial tem potencialidade de identificar os riscos a que estão sujeitos os processos de contratação, avaliar sua probabilidade e impacto (com fundamento em cálculos estatísticos e exame de consequencias possíveis) e apontar medidas de tratamento tecnicamente recomendáveis e possíveis, algumas já implementadas em concreto por outros órgãos ou entidades, com natureza publica ou privada. Os dados e informações processados pela inteligência artificial podem gerar modelos de mapa de riscos e de matrizes de risco com mais eficiência e eficácia.

5.4 INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA ETAPA PREPARATÓRIA DO PROCESSO DA CONTRATAÇÃO PÚBLICA

5.4.1 Motivação das decisões: a Lei nº 14.133/21 elenca a motivação como princípio de regência do processo (art. 5º), e como dever jurídico elementar previsto no art. 18, IX, que preceitua que “a motivação circunstanciada das condições do edital, tais como justificativa de exigências de qualificação técnica, mediante indicação das parcelas de maior relevância técnica ou valor significativo do objeto, e de qualificação econômico-financeira, justificativa dos critérios de pontuação e julgamento das propostas técnicas, nas licitações com julgamento por melhor técnica ou técnica e preço, e justificativa das regras pertinentes à participação de empresas em consórcio”. Motivar implica apontar as razões de fato e de direito que levaram a uma determinada conduta. A motivação tem relevantes relações com o controle interno e com a legitimidade do processo. O treinamento do modelo de inteligência artificial pode levar a sugestões eficientes de motivação de atos administrativos.

5.4.2 Redação de textos: é notório que a redação de textos constitui um desafio, por vezes insuperável, para os agentes públicos. Não é incomum que agentes especializados em áreas de conhecimento tocantes às ciências exatas demonstrem pouca familiaridade e aptidão para a redação. A inteligência artificial, mediante treinamento adequado do modelo, tem potencialidade efetiva para a redação de textos (dispositivos normativos do instrumento convocatório, justificativas, entre outros) indispensáveis para o regular processamento da contratação pública.

5.4.3 Comparação analítica e crítica de documentos: a etapa preparatória do processo da contratação envolve a elaboração de documentos com conteúdo bastante complexo, seja sob a perspectiva jurídica, seja sob a perspectiva técnica. No plano geral devem ser elaborados o estudo técnico preliminar, o termo de referencia ou projeto básico, o orçamento estimativo, o instrumento convocatório e algumas minutas, como a do futuro contrato. As características especificas e a complexidade dos documentos implicam o grave risco de que o conteúdo deles contenha antagonismos, contradições ou omissões. Mediante submissão dos textos dos documentos à apreciação da inteligência artificial podem ser identificadas estas imprecisões contraditórias ou antagônicas para as devidas correções. A avaliação pela inteligência artificial tem a potencialidade também, mediante adequado treinamento do modelo, para apontar contradições ou antagonismos em relação a textos de Lei, atos normativos infralegais, precedentes de Tribunais de Contas ou mesmo à Constituição Federal.

5.4.4 Sugestões de requisitos de habilitação técnica ou habilitação econômico-financeira: a habilitação é a fase do processo da contratação em que se verifica o conjunto de informações e documentos necessários e suficientes para demonstrar a capacidade do licitante de realizar o objeto da licitação, dividindo-se em: I – jurídica; II – técnica; III – fiscal, social e trabalhista;

IV – econômico-financeira. Os requisitos de habilitação jurídica, e de regularidade fiscal, social e trabalhista são comprovados mediante apresentação dos documentos estabelecidos na Lei. E, salvo exceções legalmente previstas, são exigíveis em todos os processos de contratação. Já os requisitos de habilitação técnica ou econômico-financeira se destinam à redução dos riscos de inexecução contratual, e são definidos em face do caso concreto, a depender dos riscos efetivos que podem comprometer a execução contratual. A cada processo de contratação os agentes públicos, avaliando os riscos envolvidos, definirão os requisitos de habilitação técnica e/ou econômico financeira que serão exigidos dos licitantes. A inteligência artificial, analisando e processando dados e informações ofertadas ou capturadas em bases exógenas e endógenas de dados tem a potencialidade de apontar requisitos técnicos ou econômico-financeiro aceitáveis nos termos de Lei, e que sejam indispensáveis para mitigar ou prevenir os riscos de execução do contrato. No que tange a estes requisitos de habilitação, não raros são os apontamentos feitos pelos órgãos de controle interno e externo acerca da falta ou insuficiência de justificativa para sua adoção. As saídas produzidas pela inteligência artificial contribuir substancialmente para caracterizar a motivação circunstanciada das decisões administrativas de que trata o art. 18, IX da Lei nº 14.133/21.

5.4.5 Soluções disponíveis no mercado: o propósito específico de toda a contratação pública é a satisfação de uma específica necessidade administrativa mediante solução técnica encontrada no mercado em que se insere o objeto do contrato. Há soluções que são comuns no mercado. Contudo, se pode cogitar de necessidades administrativa que comportem diversidade de soluções, algumas sequer conhecidas pelos agentes públicos. A inteligência artificial, com base em pesquisas feitas em múltiplas fontes de dados, pode identificar, senão todas, muitas soluções de mercado que possam atender a necessidade administrativa, com informações sobre qual delas pode ser a mais adequada para constituir o objeto da contratação, inclusive com considerações sobre custos indiretos, relacionados com as despesas de manutenção, utilização, reposição, depreciação e impacto ambiental do objeto licitado, entre outros fatores vinculados ao seu ciclo de vida, para a definição do menor dispêndio de que trata o art. 34, § 1º da Lei nº 14.133/21[12].

5.4.6 Elaboração de orçamento estimativo: uma das tarefas mais complexas do processo da contratação pública é a elaboração de orçamento estimativo. É um dever jurídico dos agentes públicos identificar o preço de mercado de certo produto, serviço ou obras, de modo a mitigar ou eliminar o risco de contratações com sobrepreço, superfaturamento ou mesmo de contratações por preço inexequível. O art. 23 da Lei nº 14.133/21 contempla parâmetros objetivos que devem ser utilizados para esta obtenção de preço estimado do futuro contrato. A inteligência artificial pode ser instrumento fundamental para a avaliação de dados disponíveis em bases endógenas ou exógenas, de modo a produzir um referencial adicional para a elaboração do orçamento estimativo. Também pode ser instrumento bastante importante para o tratamento dos preços obtidos por intermédio dos parâmetros apontados na Lei, como por exemplo, apontar a mediana ou a moda dos preços coletados.

5.5 INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA ETAPA DE SELEÇÃO DO FORNECEDOR OU PRESTADOS

5.5.1 Análise de documentos de habilitação técnica ou de habilitação econômico-financeira: o instrumento convocatório da licitação pode prever requisitos de habilitação técnica ou de habilitação econômico-financeira que devem ser cumpridos pelos licitantes interessados na contratação. A submissão, pelo órgão decisório do certame (pregoeira ou pregoeiro, agente de contratação ou comissão de contratação), dos documentos de habilitação apresentados para análise pela inteligência artificial, mediante prompt e treinamento de máquina adequados, pode apontar a adequação ou inadequação deles, em contraste com as regras do edital, com a lei e com critérios técnicos previamente estabelecidos e informados ao modelo.

5.6 INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA FASE DE EXECUÇÃO DOS CONTRATOS

5.6.1 Avaliação de desempenho contratual: a norma contida no art. 88, § 3º da Lei nº 14.133/21 prevê que “a atuação do contratado no cumprimento de obrigações assumidas será avaliada pelo contratante, que emitirá documento comprobatório da avaliação realizada, com menção ao seu desempenho na execução contratual, baseado em indicadores objetivamente definidos e aferidos, e a eventuais penalidades aplicadas, o que constará do registro cadastral em que a inscrição for realizada”. O cumprimento do dever jurídico de configurar um sistema de avaliação de desempenho contratual, e de avaliar, mediante indicadores objetivos, este desempenho, pode ser efetivado com o apoio em modelo de inteligência artificial.

5.6.2 Recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato: circunstâncias com natureza contratual (alteração dos contratos, por exemplo) ou outras com natureza extracontratual, inclusive aquelas decorrentes de fatos imprevisíveis ou previsíveis com consequencias incalculáveis pode induzir o desequilíbrio econômico-financeiro do contrato. A recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato se faz pelos institutos da revisão, reajuste em sentido estrito ou reajuste por repactuação. Por intermédio do adequado treinamento do modelo de inteligência artificial e do prompt correto, se pode obter resultados de inteligência artificial que apontem para a efetiva existência de desequilíbrio econômico-financeiro apto a justificar a recomposição, em especial, por intermédio da revisão contratual. Esta saída de inteligência artificial pode reduzir substancialmente o risco de revisão contratual (risco de ser concedida uma revisão contratual sem que exista o direito) e conferir maior segurança jurídica para os agentes encarregados desta análise e decisão.

5.6.3 Comprovação do cumprimento do encargo contratual: todo contrato contém um encargo contratual que o caracteriza (conjunto de obrigações, principal e acessórias). Compete ao contrato executar fielmente o encargo contratual, e, em contraparte, à Administração gerir e fiscalizar a execução deste encargo. A aferição do cumprimento de certas obrigações contratuais é bastante simples, e configura tarefa que não exige elevado grau de preparo técnico ou capacitação. Contudo, há obrigações contratuais que, em razão da natureza do contrato, são bastante complexas, exigindo especial grau de qualificação e capacitação técnica dos agentes encarregados da fiscalização contratual. Nestas hipóteses, a inteligência artificial pode ser ajustada (treinamento do modelo) para identificar erros ou falhas de execução. Pode-se referir, por exemplo, ao controle de cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias por parte dos contratados, no que diz com os contratos de prestação de serviços com dedicação exclusiva de mão de obra (DEMO).

As referências feitas acerca do uso em concreto de inteligência artificial nos processos de contratação pública não são, por óbvio, exaustivas, mas apenas exemplificativas. O uso de inteligência artificial nos processos de contratação pública admite tão amplas hipóteses, quanto são amplas as potencialidades da inteligência humana para treinamento de modelos destinado à excelência e eficiência da Administração contratante e do próprio contrato.

6. CONCLUSÕES

a. Há dever de inovação nos processos de contratação pública por parte da Administração Pública, da alta administração dos órgãos e entidades, e dos agentes públicos encarregados das funções essenciais;

b. É indesculpável para a alta administração e para os agentes públicos envolvidos no processo da contratação – sob o prisma jurídico – (i) não reconhecer a importância deste instrumento de técnica e de tecnologia; (ii) não conhecer os fundamentos básicos de seu funcionamento; (iii) não adotar condutas administrativa voltadas à aplicação de inteligência artificial nos processos de contratação pública, diante de suas tamanhas possibilidades técnicas;

c. Por intermédio de modelos adequados se pode realizar o treinamento de máquina – machine learning – destinado a orientar a inteligência artificial para saídas que possam otimizar e conferir mais eficácia e eficiência para os processos de contratação pública;

d. Há instrumentos de inteligência artificial disponíveis a preços acessíveis no mercado em que este objeto;

e. A omissão no que tange à utilização da inteligência artificial nos processos de contratação pública, caso seja causa de prejuízos para o interesse público é responsabilizável no plano pessoal;

f. A inteligência artificial pode produzir resultados – saídas – relevantes e relativas a todas as etapas do processo da contratação, mediante parâmetros previamente adotados em sistemática de treinamento de máquina por intermédio do modelo eleito – machine learning com uso de modelo de inteligência artificial;

g. Parecem inegáveis os ganhos de eficiência decorrentes do uso da inteligência artificial nos processos de contratação pública.

7. REFERÊNCIAS

COZMAN, Fabio G.; NERI, Hugo. O que, afinal, é inteligência artificial? In: COZMAN, Fabio G.; PLONSKI, Guilherme Ary; NERI, Hugo (org.). Inteligência artificial: avanços e tendências. São Paulo: Instituto de Estudos Avançados, 2021. p. 19.

FERREIRA, Rafael Gastão Coimbra. Data Warehouse na prática: fundamentos e implantação. 2020. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/25495/000748643.pdf. Acesso em: 20 nov. 2024.

KNEUSEL, Ronald T. Como funciona a inteligência artificial: da magia à ciência. São Paulo: Novatec, 2024.

OLIVEIRA, Mariana Gonçalves de. Modelagens de um Data Lake: de dados brutos à área de negócio. 2021. Disponível em: https://acervodigital.ufpr.br/xmlui/bitstream/handle/1884/71070/R%20-%20E%20-%20MARIANA%20GONCALVES%20DE%20OLIVEIRA.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 20 nov. 2024.

SANTOS, Filipe Elienai Santos Souza. Engenharia de prompt: guia completo para o uso eficiente de inteligências artificiais. E-book. 2024. Disponível em: Kindle Unlimited.

IBERDROLA. O que é Machine Learning. Disponível em: https://www.iberdrola.com/inovacao/o-que-e-machine-learning. Acesso em: 20 nov. 2024.

AMAZON WEB SERVICES (AWS). What is Machine Learning? Disponível em: https://aws.amazon.com/pt/what-is/machine-learning/. Acesso em: 20 nov. 2024.

______________________________________________

[1] KNEUSEL, Ronald T. Como funciona a inteligência artificial. Da magia à ciência. São Paulo: Novatec, 2024, p. 15.

[2] O que, afinal, é Inteligência Artificial? Inteligência artificial [livro eletrônico: avanços e tendências / organizadores Fabio G. Cozman, Guilherme Ary Plonski, Hugo Neri. São Paulo: Instituto de Estudos Avançados, 2021, p. 19.

[3] Disponível em: https://www.iberdrola.com/inovacao/o-que-e-machine-learning.

[4] Disponível em: https://aws.amazon.com/pt/what-is/machine-learning/.

[5] Disponível em: https://hub.asimov.academy/blog/o-que-sao-algoritmos/.

[6] Disponível em: https://azure.microsoft.com/pt-br/resources/cloud-computing-dictionary/what-are-machine-learning-algorithms#:~:text=O%20que%20%C3%A9%20Machine%20Learning,algoritmo%20calcula%20resultados%20mais%20precisos.

[7] Op. cit. p. 20.

[8] SANTOS, Filipe Elienai Santos Souza. Engenharia de prompt: guia completo para o uso eficiente de inteligências artificiais, 2024, p. 6. e-book disponível em Kindle Unlimited.

[9] OLIVEIRA, Mariana Gonçalves de. Modelagens de um Data Lake: De dados brutos a área de negócio. Disponível em: https://acervodigital.ufpr.br/xmlui/bitstream/handle/1884/71070/R%20-%20E%20-%20MARIANA%20GONCALVES%20DE%20OLIVEIRA.pdf?sequence=1&isAllowed=y.

[10] FERREIRA, Rafael Gastão Coimbra. Data Warehouse na prática: Fundamentos e implantação. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/25495/000748643.pdf?…1.

[11] Como exemplo de destaque, o Tribunal de Contas da União, que utiliza a inteligencia artificial nas seguintes modelagens: Alice (Análise de Licitações e Editais), Monica (Monitoramento Integrado para o Controle de Aquisições), Adele (Análise de Disputa em Licitações Eletrônicas), Sofia (Sistema de Orientação sobre Fatos e Indícios para o Auditor), Carina (Crawler e Analisador de Registros da Imprensa Nacional) e Ágata (Aplicação Geradora de Análise Textual com Aprendizado). Foi criada também uma ferramenta de gpt próprio, o ChatTCU, baseada em um ambiente restrito, voltada para a produção de textos, reformulação de textos, e ações de controle externo.

[12] Exemplo de prospecção de solução de mercado com o uso do ChatGpt da OpenAI:

Prompt – Você é especialista em licitações e contratações públicas. Foi designado para encontrar uma solução para a contratação de serviços de limpeza da fachada de um prédio da Administração. O prédio está situado no centro histórico do Município de São Luis do Maranhão, e é tombado pelo patrimônio histórico. Encontre no mercado as soluções (objetos do contrato) disponíveis que podem se objeto da contratação, com respeito a todas as leis aplicáveis a imóveis tombados. Aponte também os riscos envolvidos em cada uma das soluções de contratação de prestação de serviços de limpeza.

Saída do modelo – Para contratar serviços de limpeza da fachada de um prédio tombado no centro histórico de São Luís do Maranhão, é fundamental considerar as restrições legais e as técnicas adequadas para preservar o patrimônio histórico. A seguir, apresento as soluções disponíveis no mercado e os riscos associados a cada uma:

1. Limpeza Manual com Produtos Neutros Descrição: Utilização de escovas macias e produtos de limpeza neutros para remover sujeiras superficiais sem agredir os materiais originais da fachada. Riscos:

Danos ao Revestimento: Uso inadequado de escovas ou produtos pode causar abrasão ou manchas.

Eficiência Limitada: Pode não ser eficaz para remoção de sujeiras mais profundas ou incrustadas.

2. Limpeza com Jateamento de Água em Baixa Pressão

Descrição: Aplicação de água em baixa pressão para remover sujeiras sem comprometer a integridade da fachada.

Riscos:

Infiltrações: Se não houver impermeabilização adequada, a água pode penetrar e causar danos estruturais.

Desprendimento de Materiais: Em materiais mais frágeis, o jateamento pode provocar desprendimentos.

3. Limpeza Química Controlada

Descrição: Uso de produtos químicos específicos para dissolver sujeiras, seguido de enxágue controlado.

Riscos:

Reações Químicas Indesejadas: Produtos inadequados podem reagir com materiais da fachada, causando danos.

Resíduos Químicos: Necessidade de manejo adequado para evitar contaminação ambiental.

4. Limpeza com Microabrasão

Descrição: Técnica que utiliza partículas finas para remover sujeiras sem danificar a superfície.

Riscos:

Desgaste Excessivo: Se mal executada, pode remover camadas protetoras ou detalhes históricos.

Necessidade de Profissionais Especializados: Requer mão de obra qualificada para evitar danos.

Considerações Legais e Procedimentais:

Autorização Prévia: Antes de qualquer intervenção, é obrigatório obter autorização do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Isso inclui a apresentação de um anteprojeto detalhado da obra, conforme orientações disponíveis no site do IPHAN.

FRANCO ARQUITETURA

Conformidade com Normas Técnicas: As técnicas e materiais utilizados devem estar em conformidade com as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e outras regulamentações pertinentes.

Contratação de Empresas Especializadas: É recomendável contratar empresas com experiência comprovada em limpeza e manutenção de fachadas de imóveis tombados, garantindo a preservação das características históricas.

Riscos Gerais na Contratação:

Danos ao Patrimônio: A utilização de técnicas inadequadas pode causar danos irreparáveis à fachada histórica.

Responsabilidade Legal: Intervenções sem autorização podem resultar em sanções legais e multas.

Desvalorização do Imóvel: Danos à fachada podem comprometer o valor histórico e comercial do prédio.

Portanto, é essencial seguir rigorosamente as orientações dos órgãos de preservação do patrimônio e contratar profissionais qualificados para garantir a integridade e a preservação do edifício histórico.

 

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Como citar o conteúdo do Blog Zênite:
SANTOS, José Anacleto Abduch. Inteligência artificial no processo da contratação pública. Blog Zênite. Disponível em: https://zenite.blog.br/inteligencia-artificial-no-processo-da-contratacao-publica/. Acesso em: [data de acesso].

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