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DFD, ETP e TR – Passo a passo para compras e serviços
por Equipe Técnica da ZêniteCapacitação Online | 23, 24, 27 a 31 de janeiro
No que tange aos contratos a serem firmados pelas empresas estatais, esse novo regime jurídico deixa claro orientar-se pelas cláusulas fixadas nos próprios instrumentos contratuais, pelo disposto na Lei nº 13.303/16 e pelos preceitos de direito privado. Inclusive, no que se refere à disciplina fixada pela Lei nº 13.303/16 para reger os contratos das empresas estatais, verifica-se que ela privilegia, justamente, a observância das regras próprias do direito privado para o estabelecimento dessas relações jurídicas.
Prova disso é o fato de a Lei nº 13.303/16 ter abolido as cláusulas exorbitantes previstas na Lei nº 8.666/93 e que desequilibravam a relação de igualdade entre as partes contratantes sempre a favor da Administração.
As cláusulas exorbitantes, também chamadas de cláusulas de prerrogativas ou cláusulas derrogatórias por alguns autores, são um rótulo atribuído à faculdade de que dispõe a Administração Pública de instabilizar o vínculo contratual, quer modificando unilateralmente os termos do ajuste, rescindindo-o, fiscalizando a execução, aplicando sanções ao contratado, quer ocupando provisoriamente bens imóveis, instalações, etc.
Essa prerrogativa estatal é qualificada de exorbitante porque é excepcional em relação ao direito privado, isto é, nas relações entre particulares não é legalmente permitido a uma das partes, unilateralmente, valer-se das prerrogativas apontadas. A presença das denominadas cláusulas exorbitantes em um contrato tipicamente privado ensejaria sua anulação pelo Poder Judiciário.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro define cláusulas exorbitantes como
aquelas que não seriam comuns ou que seriam ilícitas em contrato celebrado entre particulares, por conferirem prerrogativas a uma das partes (a Administração) em relação à outra; elas colocam a Administração em posição de supremacia sobre o contratado. (DI PIETRO, 2008, p. 253.)
Na medida em que todos são iguais perante a lei, conforme assegura o art. 5º da Constituição Federal, e que o Estado se submete ao Direito (Estado de Direito), cumpre à Administração Pública pautar seus atos pela legalidade. Logo, somente a lei tem o poder para desigualar aqueles que, a princípio, estão em condição de igualdade.
Diferentemente da Lei nº 8.666/93, a Lei nº 13.303/16 não admite às empresas estatais promoverem alterações contratuais de forma unilateral nos termos do regime contemplado na Lei nº 8.666/93. Também não permite a aplicação de penalidades cujos efeitos ultrapassem e criem restrições de direitos perante terceiros. Outra novidade, nesse mesmo sentido, é a impossibilidade de as empresas estatais rescindirem unilateralmente os contratos firmados.
Tomada a situação sob esse enfoque, o desfazimento dos contratos firmados pelas empresas estatais passa a se submeter à mesma disciplina comumente aplicada nos contratos de direito privado, o que, em regra, pressupõe a extinção do ajuste de modo natural, por meio do cumprimento de suas obrigações ou mediante a aplicação de algum instituto capaz de desfazer os ajustes antes do exaurimento das obrigações avençadas.
Nesse sentido, a Lei nº 13.303/16, em seu art. 69, inc. VII, estabelece as cláusulas necessárias que os contratos deverão conter:
Art. 69. São cláusulas necessárias nos contratos disciplinados por esta Lei:
(…)
VII – os casos de rescisão do contrato e os mecanismos para alteração de seus termos; (Grifamos.)
Ocorre que, em seu art. 29, inc. VI, a Lei nº 13.303/16 já havia feito menção à possibilidade de dispensar a licitação para a
contratação de remanescente de obra, de serviço ou de fornecimento, em consequência de rescisão contratual, desde que atendida a ordem de classificação da licitação anterior e aceitas as mesmas condições do contrato encerrado por rescisão ou distrato, inclusive quanto ao preço, devidamente corrigido.
Promovendo-se a interpretação sistêmica de seus dispositivos, de modo que um não retire a eficácia ou mesmo provoque a anulação dos efeitos de outro, entende-se que as empresas estatais poderão prever, nos instrumentos convocatório e contratual, não apenas os casos de rescisão do contrato, mas os casos que, de acordo com o direito privado, autorizam o desfazimento do vínculo jurídico ou retiram a eficácia de suas disposições para o futuro.
Com base nessa ordem de ideias, entende-se que, em vez de as empresas estatais adotarem “a mesma disciplina contida na Lei nº 8.666/93, qual seja, rescisão unilateral e seus respectivos caso, rescisão amigável e rescisão judicial”, cumpre a elas estabelecerem, nas minutas dos instrumentos convocatório e contratual, as hipóteses que autorizam a extinção dos contratos alinhados com o regime do Código Civil, especificamente arts. 472 a 480.
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Desse modo, vislumbra-se possível a Administração prever, nas minutas dos instrumentos convocatório e contratual, hipóteses de inadimplemento contratual da contratada, autorizando o distrato contratual. Sobre esse instituto, Araken de Assis ensina:
Fundamentalmente, o distrato não resile o contrato, porque não o dissolve, ou desfaz, desde o início (resolução, eficácia ex tunc) ou a partir de certo momento (resilição, eficácia ex nunc). O distrato elimina a eficácia do negócio quanto ao futuro, de modo que o contrato, que foi, continua sendo, embora acabado, encerrado e desprovido de efeitos. O distrato não “descontrata”, exceto em sentido assaz figurado. Tampouco consagra um mútuo dissenso1: os distratantes concordam plenamente, entre eles não há desacordo (mutuus dissensus)2 ou desentendimento, vez que ambos, obviamente, querem distratar.
Disso resulta, em suma, que o distrato é o trato em sentido contrário. O art. 472 consagra o contrarius consensus. De acordo com Pontes de Miranda, a figura prevista neste dispositivo representa o contrato pelo qual se desfaz a relação jurídica de dívida existente, ou, se a dívida ainda não existe, contrato pelo qual se desfaz o vínculo de que se irradiariam as dívidas futuras3. É o contrato pelo qual os figurantes eliminam o vínculo, para o futuro, que anteriormente estabeleceram entre si. Relevada a imprópria menção à figura da risoluzione consensuale, mostra-se correto o conceito ministrado por Vicenzo Roppo: il contratto com cui le parti sciolgono un precedente contratto fra loro, liberandosi dal relativo vincolo4. (ASSIS, 2004, p. 58-61.) (Grifamos.)
Em suma, tendo em vista a ausência de previsão na Lei nº 13.303/16 autorizando as empresas estatais rescindirem unilateralmente seus contratos, bem como a opção adotada pelo legislador de abolir as cláusulas exorbitantes fixadas pela Lei nº 8.666/93, submetendo em matéria contratual as empresas estatais a aplicação de regi22me jurídico tipicamente de direito privado, entende-se não ser adequado a Administração consulente simplesmente ignorar essa sistemática legal e prever nas suas minutas padrão de editais e de contratos a mesma disciplina contida na Lei nº 8.666/93, qual seja: rescisão unilateral e seus respectivos casos.
No que se refere à previsão de rescisão pela via amigável e judicial, não haveria qualquer óbice, uma vez que o direito privado também contempla esses mecanismos para desfazimento do ajuste contratual.
Tal como afirmado, conclui-se que as empresas estatais devem estabelecer, nas minutas dos instrumentos convocatório e contratual, as hipóteses que autorizam a extinção dos contratos em atenção ao disposto no direito privado, alinhados com o regime do Código Civil.
REFERÊNCIAS
ASSIS, Araken de. Do distrato no novo Código Civil. Revista CEJ, Brasília, n. 24, p. 58-61, jan./mar. 2004. Disponível em: <http://www.cjf.jus.br/revista/numero24/artigo10.pdf>. Acesso em: 23 abr. 2017.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 253.
1 BEVILAQUA, Clovis. Código civil comentado. São Paulo: Red Livros, 2000. v. 4, p. 260.
2 Emprega tal figura imprópria, porém, ALMEIDA, Francisco de Paula Lacerda de. Obrigações. 2. ed. Rio de Janeiro: Jacinto Ribeiro dos Santos, 1916. p. 354. O mutuus dissensus, no Direito romano, correspondia a contrarius consensus, ou seja, um acordo visando a destruir um prévio consensus contratual, explica CANCELLI, Fillippo. Dissenso (profilo storico). Enciclopédia del Diritto. n. 1. Milão: Giuffrè, 1964. v. 13, p. 235, mas na doutrina moderna significa o mal-entendido, decorrente de mau entendimento ou da má percepção da declaração de vontade do parceiro (v. MESSINEO, Francesco. Dissenso (diritto civile). Enciclopédia del Diritto. Milão: Giuffrè, 1964. v. 13, p. 247-249).
3 MIRANDA, op. cit., p. 284-285.
4 ROPPO, Vincenzo. Il contratto. IUDUCA, Giovanni; ZATTI, Paolo. Trattado di diritto privado. Milão: Giuffrè, 2001. p. 539-540.
Nota: Esse material foi originalmente publicado na Revista Zênite – Informativo de Licitações e Contratos, na seção Orientação Prática. A Revista Zênite e o Zênite Fácil esclarecem as dúvidas mais frequentes e polêmicas referentes à contratação pública, nas seções Orientação Prática e Perguntas e Respostas. Acesse www.zenite.com.br e conheça essas e outras Soluções Zênite.
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