TCU: o PNCP não é indispensável à aplicabilidade imediata da Lei nº 14.133/2021

Nova Lei de Licitações

Em precedente recente, Acórdão nº 2.458/2021 – Plenário, o TCU respondeu consulta formulada pela Secretaria-Geral de Administração do próprio Tribunal (Segedam), com base em questão suscitada pela Secretaria de Licitações, Contratos e Patrimônio (Selip) quanto à imediata aplicação da Lei nº 14.133/2021 aos procedimentos de contratação direta, por dispensa de licitação, em razão do valor, de bens e serviços para o TCU que, pelo valor estimado, se enquadrem na hipótese do (art. 75, II, da Lei nº 14.133/21), sem que: a) o Portal Nacional de Contratações Públicas – PNCP, criado pelo art. 174 da Lei nº 14.133/2021, estivesse disponível; e b) a regulamentação de dispositivos legais fosse concluída.

A despeito do recente lançamento do PNCP, a operacionalização pertinente ainda resta inviabilizada pelos não integrantes do SISG. Conforme trecho da Selip, extraído do Relatório, “6. Com efeito, em 9/8/2021, o Ministério da Economia fez o lançamento oficial do Portal Nacional de Contratações Públicas, disponibilizando, em sítio eletrônico específico, parte das funcionalidades descritas na nova Lei n° 14.133/2021, inclusive as relacionadas à publicidade dos instrumentos de contrato. 7. Ocorre que, a despeito de todo o esforço que desde então tem sido empreendido pelas unidades competentes, sobretudo pela Selip e pela Diretoria de Gestão de Soluções de TI para a Administração (DGA/Adgedam), ainda não é tecnicamente viável a utilização do PNCP pela área administrativa do TCU. E, infelizmente, não se afigura possível antever de pronto, com satisfatória precisão, o tempo que ainda despenderão as medidas necessárias ao efetivo acesso às funcionalidades do Portal. 8. A dificuldade reside, sobretudo, no fato de não haver possibilidade de alimentação manual de dados no PNCP. A inserção, modificação ou exclusão de dados no Portal é feita mediante integração de sistemas. No caso do TCU, que é órgão não vinculado ao Sistema de Serviços Gerais (Sisg), do grupo chamado órgãos ‘não-Sisg’, trata-se de integração de ‘sistemas externos’ – sob o ponto de vista do Ministério da Economia – com o Portal. Esclareço, nesse sentido, que, diversamente do que ocorre no âmbito dos órgãos Sisg, que por regra utilizam as ferramentas de provimento centralizado do Ministério da Economia, a área administrativa do TCU dispõe de sistema próprio de gerenciamento de contratos – o sistema Contrata. A integração, assim, a princípio, há de ser efetuada entre o Contrata e o PNCP.”

Acolhendo as considerações da Consultoria-Jurídica do Tribunal, o Min. João Augusto Ribeiro Nardes entendeu que, no que toca à regulamentação de dispositivos da Lei nº 14.133/21, na medida em que o foco da consulta envolve o art. 75, inc. II, tem-se que, “a única regulamentação específica à dispensa de licitação exigida em relação ao tema foi a prevista no § 5º do aludido artigo, em matéria afeta à alínea “c” do inciso IV de seu caput, que tratou de produtos para pesquisa e desenvolvimento, limitada a contratação, no caso de obras e serviços de engenharia, ao valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), ou seja, de objetos que não se inserem na matéria ora em análise.”

E, relativamente à inserção de informações no PNCP, considerou “pertinentes as observações da CONJUR deste Tribunal quanto a uma adequada interpretação lógico-sistemática da Lei 14.133/21, afastando-se a literalidade do art. 94, que exige a divulgação no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) como condição indispensável para a eficácia do contrato e de seus aditamentos”. Dentre os aspectos pontuados pela CONJUR, destaca-se:

27. Desse modo, considerando a importância do exercício de se extrair norma jurídica que contemple aspectos lógico-sistemáticos, bem como o alcance de interpretação válida que busque a máxima efetividade das disposições, considera-se possível a aplicação imediata da NLLC para realização de contratações diretas em razão do valor, contanto seja adotado procedimento que respeite o modelo de instrução definido no art. 72 da lei, inclusive quanto à necessidade de divulgação e manutenção, em sítio eletrônico oficial, do ato que autoriza a contratação direta ou o extrato decorrente do contrato.

(…)

34. Seria, no mínimo, ilógico que o legislador tenha previsto tão claramente um período de experimentação; indicado que ao longo desse tempo a Administração poderia optar por qual regime utilizar em cada licitação ou contratação direta; que tenha considerado 2 (dois) anos um prazo razoável de adaptação; e que tudo isso nada representasse; que; após um longo processo, o detentor da competência constitucional para legislar sobre licitação e contratação aprovasse uma Nova Lei de Licitações, mas que a efetiva possibilidade de utilização do novo regime para a Administração Pública ficasse à mercê da pressa ou da vontade de um pequeníssimo grupo – sem legitimidade democrática – de lançar a plataforma operacional do PNCP.

35. Em tese, tal visão direcionaria à desatinada conclusão de que: i) o período de 2 (dois) anos definido pelo legislador, não teria qualquer relevância, uma vez que poderia – intencionalmente ou não – ser reduzido a zero e inviabilizado para todas as esferas de governo (o que denotaria, inclusive, afronta à autonomia entre os entes); ou ii) na hipótese de o PNCP não ser implementado até abril de 2023, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios estariam impedidos de realizar contratações, tendo em vista a programada derrogação das Leis n. 8.666/1993; 10.520/2002; e 12.462/2011. 

(…)

44. De todo modo, considerando que uma das principais atribuições do PNCP é a “divulgação centralizada e obrigatória dos atos exigidos” pela Nova Lei (art. 174, I), é possível concluir que quando a NLLC impõe a publicação em sítio eletrônico oficial esta deverá ser procedida no PNCP – a partir do momento em que os responsáveis já o tiverem disponibilizado.

45. Caso contrário, compreende-se que a divulgação dos órgãos e entidades contratantes deverá retratar “caixa de vidro” com o mesmo nível de transparência abstratamente previsto, seja em seu aspecto formal, como requisito para a validade e a eficácia dos atos; seja para a publicidade material que “não está restrita apenas à publicização dos motivos que ocasionaram o ato administrativo, mas também à efetividade da publicidade, possibilitando o acesso real aos atos praticados no exercício da função administrativa”.

46. Assim, com objetivo de atender à definição do art. 6º, inciso LII, para além da recomendável divulgação no portal digital do TCU sugerida pela unidade responsável, a publicação do ato que autoriza a dispensa ou do extrato decorrente do contrato deverá ser realizada, no mínimo, em sítio da internet, certificado digitalmente por autoridade certificadora. Assim, para as contratações pretendidas desta Casa, avalia-se adequada a utilização do Diário Oficial da União – DOU. (Destacamos.)

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Em conclusão, manifestou-se o Ministro no sentido de que “não me parece razoável que seja vinculada a eficácia de uma nova lei, que traz expressamente em seu art. 194 o comando de que ‘entra em vigor na data de sua publicação’ (1º/4/2021), à necessária utilização de um Portal previsto em seu próprio texto. A referida eficácia da norma somente poderia ser limitada mediante previsão expressa no corpo da lei em análise.” (Destacamos.) E continuou: “Nesse contexto, entendo ser possível a utilização do art. 75 da NLLC por órgãos não vinculados ao Sistema de Serviços Gerais (Sisg), do grupo chamado órgãos ‘não-Sisg’, em caráter excepcional e transitório, até que sejam concluídas as medidas necessárias ao efetivo acesso às funcionalidades do PNCP. Nesse período, como reforço à transparência que deve ser dada às contratações diretas, que seja utilizado o Diário Oficial da União – DOU como mecanismo adicional ao atendimento da diretriz legal.”

A despeito da grande controvérsia que envolveu (e ainda envolve) a temática, este foi o posicionamento da Zênite, publicado em abril deste ano.

Conforme defendemos à época, “Por ser uma Lei muito preocupada com governança, fica bastante clara a intenção do legislador pela transformação num governo fortemente digital e com mecanismos de centralização. O PNCP compreenderá, sem sombra de dúvida, importante instrumento nesse sentido. Agora, não se pode confundir o “instrumento” com a “norma”, esta subjacente ao dispositivo. E a “norma”, ao tratar do uso do PNCP como instrumento de publicidade dos atos praticados nos processos de contratação, antes de qualquer outro fator, pretendeu materializar o dever de publicidade dos atos praticados nos processos de contratação, e todos os reflexos a ele inerentes (transparência, controle, prestígio à competitividade etc.). Logo, até que seja criado o PNCP, cabe aos órgãos e entidades que optarem por já adotar o regime da Lei nº 14.133/2021 (conforme expressamente autorizado no art. 191 c/c art. 193, inc. II e art. 194) observarem, enquanto instrumento de publicidade, os veículos de divulgação oficial atualmente existentes e que têm cumprido a finalidade normativa, inclusive o próprio sítio eletrônico oficial do órgão ou entidade.” (vide https://zenite.blog.br/lei-no-14-133-21-a-nova-lei-de-licitacoes-esta-vigente-e-e-aplicavel/)

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