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HABILITAÇÃO NAS CONTRATAÇÕES PÚBLICAS
por Equipe Técnica da ZêniteCapacitação Online | 09 a 12 de dezembro | Carga horária: 16 horas
Questão apresentada à Equipe de Consultoria Zênite:
“A Administração indaga se uma compra de brindes, realizada uma vez ao ano, pode ser qualificada como um fornecimento contínuo e, permitir que a vigência do contrato seja fixada desde logo por dois anos, possibilitando a sua prorrogação por até 10 anos, nos termos do art. 107 da Lei nº 14.133.”
DIRETO AO PONTO
De acordo com as informações prestadas pela Administração Consulente, tudo sugere a impossibilidade de atribuir à contratação a natureza de um fornecimento contínuo.
Logo, a contratação deve ter a sua duração subordinada à regra geral do art. 105 da Lei nº 14.133/2021. E, nesse ponto, caso o volume da demanda de brindes seja insuscetível de ser definida desde logo, e a Administração prefira o registro de preços ao contrato com quantitativos estimados, a duração da ata poderá ser de um ano, passível de prorrogação por igual período, contanto que demonstrada a vantajosidade na manutenção dos termos registrados (art. 84, da Lei nº 14.133/2021).
FUNDAMENTO
Antes de adentrar na resolução da questão, partiremos da premissa de que foi devidamente avaliada a aquisição de brinde à luz da missão institucional da Consulente, uma vez que esse tipo de dispêndio de recursos públicos, não raras vezes, é objeto de apontamento por parte do TCU,1 existindo, inclusive, vedação expressa em normatização federal.2
Feito este registro, a Lei nº 8.666/93 faz menção aos serviços contínuos (ou continuados) em seu art. 57, inciso II, sem, contudo, determinar os elementos que permitem enquadrar as atividades nesse conceito.
Ao longo dos anos, essa natureza foi atribuída aos contratos de serviços qualificados como essenciais para a Administração Pública, e cuja ausência ou interrupção na sua prestação colocavam as atividades públicas em risco de serem paralisadas.
Tanto é que o Tribunal de Contas da União, citado como referência, assim trata da questão:
“Serviços de natureza contínua são serviços auxiliares e necessários à Administração no desempenho das respectivas atribuições. São aqueles que, se interrompidos, podem comprometer a continuidade de atividades essenciais e cuja contratação deva estender-se por mais de um exercício financeiro. O que é contínuo para determinado órgão ou entidade pode não ser para outros. São exemplos de serviços de natureza contínua: vigilância, limpeza e conservação, manutenção elétrica, manutenção de elevadores, manutenção de veículos etc.”3 (Destacamos.)
A Instrução Normativa nº 05/2017, também citada a título ilustrativo, segue racionalidade similar:
“Art. 15. Os serviços prestados de forma contínua são aqueles que, pela sua essencialidade, visam atender à necessidade pública de forma permanente e contínua, por mais de um exercício financeiro, assegurando a integridade do patrimônio público ou o funcionamento das atividades finalísticas do órgão ou entidade, de modo que sua interrupção possa comprometer a prestação de um serviço público ou o cumprimento da missão institucional.
Parágrafo único. A contratação de serviços prestados de forma contínua deverá observar os prazos previstos no art. 57 da Lei nº 8.666, de 1993.” (Destacamos.)
Nesses termos, a conformação de um serviço como contínuo, ao menos consoante à diretriz trabalhada na vigência da Lei nº 8.666/93 – exige traços da essencialidade e da habitualidade de sua prestação em face de sua destinação, de sorte que, a paralisação de sua execução impõe prejuízo ao atendimento da missão institucional da entidade consulente, além disso, sua necessidade deve se projetar por mais de um exercício continuamente.
Ainda, interessante observar, embora essa conceituação reflita a diretriz tradicionalmente aplicada na caracterização ou não dos serviços contínuos, a Consultoria Zênite entende que a imprescindibilidade de envolverem demandas permanentes é passível de crítica (tanto é que, na Lei nº 14.133/21, o legislador já faz referência a “necessidades permanentes ou prolongadas”).
Nesse sentido, veja-se trecho de material publicado na Revista Zênite – Informativo de Licitações e Contratos (ILC):
“Informa a Administração que, não raro, necessita contratar serviços por determinado período, que se inicia no final de um exercício e adentra o exercício seguinte. Trata-se de serviços relacionados ao exercício das atividades finalísticas do órgão (prestadores de serviços para o período de cadastramento biométrico, teledigifonistas e porteiro para o mesmo período), cujas demandas sazonais, e nem sempre previsíveis, não podem ser atendidas pelos ajustes em vigor, porque ultrapassaria o limite permitido legalmente para acréscimos.
A dúvida reside em como compatibilizar essas demandas com as disposições da Lei nº 8.666/1993 a respeito da definição da vigência contratual.
(…)
A essencialidade dos serviços não se confunde com eventual caráter permanente.
Permanente envolve a demanda “que permanece; que não sofre mudanças” (DICIO, 2018). Por outro lado, é possível existam demandas essenciais, posto que impreteríveis à satisfação dos fins institucionais e atividades elementares dos órgãos e entidades, porém habituais. Nesse sentido, por habitual entende-se aquilo que é “comum; que ocorre frequente e regularmente” (DICIO, 2017).
Ora, se a Administração está diante de uma demanda essencial e, inclusive, habitual (que pode surgir inesperadamente), embora não permanente, tratar-se-á de um serviço essencialmente contínuo.
No caso concreto, entende-se que os serviços necessários ao período de cadastramento biométrico são essenciais, na medida que têm em vista a execução de atividades diretamente relacionadas aos fins institucionais dos tribunais regionais eleitorais.
E são também habituais, visto que não envolvem escopo específico, isolado. Pelo contrário, de tempo em tempo os tribunais regionais eleitorais iniciam períodos relativamente extensos para cadastramento biométrico – não adstritos ao dia 31/12 (TSE, 2018). Trata-se, portanto, de uma necessidade frequente/habitual.
Justamente em razão das circunstâncias especiais envoltas nas contratações que amparam tal período – a exemplo dos serviços de auxiliares para cadastramento, contratação de teledigifonistas e serviços de portaria – é que se entende tais ajustes, excepcionalmente, como de natureza contínua.
E, isso, frise-se, não para prorrogá-los por iguais e sucessivos períodos por até 60 meses, mas sim para, conforme autorizado pelo caput do art. 57 e inc. II, ser excepcionada a regra condizente à observância da vigência do crédito orçamentário.
Com base nesse alinhamento, sendo os serviços pontuados necessários para o período de dezembro/2017 a abri/2018, exemplificativamente, cumpriria fixar os períodos de vigência dos contratos respectivos por tal lapso temporal, com respaldo no art. 57, inc. II, da Lei nº 8.666/1993.”4
Veja-se que, mesmo tendo sido apresentada em caráter excepcional, a partir da peculiaridade envolta nas demandas próprias da Justiça Eleitoral, fato é que a racionalidade acima pode vir a ser empregada em outras situações.
Por sua vez, a Lei nº 14.133/2021 inovou no trato do tema, tanto ao incorporar ao conceito de serviços contínuos os fornecimentos, como ao conceituá-los. Fez isso em seu art. 6º, inciso XV, da seguinte forma:
“Art. 6º. (…).
XV – serviços e fornecimentos contínuos: serviços contratados e compras realizadas pela Administração Pública para a manutenção da atividade administrativa, decorrentes de necessidades permanentes ou prolongadas;” (Destacamos.)
Portanto, a identificação de um serviço ou fornecimento como sendo continuado depende de um olhar especialmente para a demanda administrativa. Se a necessidade em torno de determinados serviços ou fornecimentos, necessários ao desempenho das atividades administrativas, for permanente ou prolongada, então possível qualificá-los como “contínuos”.
Conforme pontua Marçal Justen Filho:
“A Lei nº 14.133/21 superou a tentativa, verificada durante a vigência da Lei nº 8.666/1993, de identificar os serviços e fornecimentos contínuos por atributos próprios ou intrínsecos à própria prestação. A solução consagrada na Lei nº 14.133/2021 afasta a disputa sobre as características do serviço e dá destaque aos atributos das necessidades administrativas a serem atendidas”. (Destacamos.)
E ao comentar a respeito das “necessidades prolongadas”, esclarece:
“A alusão a necessidades prolongadas é relevante porque elimina a discussão relacionada ao conceito de ‘continuidade’. Sob a égide da Lei nº 8.666/1993, existia interpretação defendendo que a interrupção da prestação do serviço afastava a configuração de um serviço contínuo. Essa questão fica ultrapassada, eis que a própria Lei reconhece que a continuidade do serviço não é afastada pela sua eventual interrupção. O fundamental reside na amplitude do prazo de execução da prestação.
Obviamente, é impossível estabelecer um critério aritmético, em dias, semanas, meses ou anos.
De todo modo, o conceito de necessidade prolongada é indeterminado. Isso significa a existência de zonas de certeza positiva e de certeza negativa. A dificuldade pode surgir a propósito da zona cinzenta. Em tais casos, a margem de autonomia decisória dependerá das circunstâncias específicas de cada caso. Isso pode envolver inclusive as questões de economia de escala na contratação, de dificuldades quanto à realização de licitações sucessivas e assim por diante.”5
Ainda sobre o tema, vale transcrever as seguintes anotações extraídas do Zênite Fácil:
“Serviços e fornecimentos contínuos – Distinção
Serviços contínuos são caracterizados por envolver uma prestação por parte do contratado que implique uma obrigação de fazer e uma necessidade permanente da Administração Pública. Atente-se que o Tribunal de Contas da União já decidiu que “serviços específicos realizados em um período predeterminado” não podem ser considerados como continuados (Acórdão 925/2019-TCU-Plenário). Já os fornecimentos contínuos também se prestam a satisfazer necessidades contínuas da Administração Pública, mas envolvem, por parte dos contratados uma obrigação de dar, de entregar algo pronto. Segundo o Tribunal de Contas de União, o que distingue um serviço contínuo de um serviço não contínuo é a essencialidade “para assegurar a integridade do patrimônio público de forma rotineira e permanente ou para manter o funcionamento das atividades finalísticas do ente administrativo, de modo que sua interrupção possa comprometer a prestação de um serviço público ou o cumprimento da missão institucional” (Acórdão nº 10.138/2017 – TCU – 2ª Câmara). Esta lógica também pode ser utilizada para definir ou identificar um fornecimento contínuo. (Nota elaborada por José Anacleto Abduch Santos.)” (Destacamos.)
“Sobre os serviços contínuos, “tendo em vista o regime da Lei nº 14.133/2021, entendemos que assumirá a natureza de serviço contínuo se e quando caracterizada sua necessidade para assegurar a manutenção da atividade administrativa, decorrente de necessidade permanente ou prolongada. Nesse caso, ainda que a demanda pela contratação surja a cada 3 ou 6 meses, não haveria óbice em classificá-lo como um serviço contínuo, nos moldes do art. 6º, inciso XV da Lei nº 14.133/2021”. (Grifamos.) (O QUE É UM SERVIÇO CONTÍNUO de acordo com a Lei nº 14.133/2021? Requer a demonstração dos traços de essencialidade e habitualidade? Um serviço executado a cada 3 ou 6 meses pode ser classificado como contínuo? Zênite Fácil, categoria Perguntas e Respostas, abr. 2022.)”6
Portanto, para classificar uma compra de bens como um “fornecimento contínuo”, é fundamental dirigir a atenção para as características da demanda pertinente: em se tratando de um fornecimento necessário ao exercício das atividades administrativas, compreendendo uma demanda permanente ou prolongada, então possível considerá-lo “contínuo” para os fins da Lei nº 14.133/21.
Justamente por depender de um olhar casuístico, considerando a realidade da própria Administração, é que não se tem como viável definir um rol de serviços/fornecimentos que possam ser considerados contínuos em todo e qualquer caso.
É dentro dessa realidade que parece um tanto quanto arriscado considerar a aquisição de brindes destinados aos servidores, que acontece uma vez por ano, como um fornecimento contínuo. O cenário de informações prestado pela Administração Consulente não possibilita identificar a compra como algo necessário à manutenção das atividades públicas realizadas pelo órgão.
Baseado nessa realidade, a qual se espelhou nas informações prestadas pela Administração Consulente, não se pode deixar de informar que a prudência conduz à impossibilidade de atribuir à contratação a natureza de um fornecimento contínuo.
NOTAS E REFERÊNCIAS
1 Especificamente sobre a aquisição de brindes, o TCU exarou o Acórdão nº 251/2021, do Plenário:
“(…)
9.5. dar ciência ao Conselho Regional de Educação Física de Santa Catarina (Cref3/SC), com fundamento no art. 9º da Resolução-TCU 315/2020, acerca das seguintes falhas:
9.5.1. a realização de despesas com festividades, eventos comemorativos, shows de humor, lanches e refeições para servidores, conselheiros e convidados, presentes, brindes e outras congêneres, incompatíveis com as finalidades institucionais do conselho, entendimento observado em precedentes que abordaram matéria correlata: decisão 290/1997-TCU-Plenário, Acórdão 63/2001-TCU-Plenário, Acórdão 270/2002-TCU-Plenário, Acórdão 375/2002-TCU-Primeira Câmara, Acórdão 225/2003-TCU-Segunda Câmara, Acórdão 1560/2003-TCU-Plenário, Acórdão 1386/2005-TCU-Plenário, Acórdão 909/2008-TCU-Segunda Câmara;” (Destacamos.)
Contudo, em outro precedente, no qual, ao que parece, a agenda não apresentou essa finalidade, o TCU considerou o item como sendo um brinde:
Acórdão nº 13.430/2020 – 1ª Câmara
“[Voto]
As despesas com compra de agendas, que nesse caso se configuram como brinde, a princípio não se enquadram nos objetivos da entidade, podendo ser consideradas irregulares.” (Destacamos.)
2 É o que consta expressamente do Decreto nº 99.188/1990, que dispõe sobre a contenção de despesas na Administração Pública Federal:
“Art. 22. A partir da data da publicação deste decreto, é vedada a realização de despesas com recursos provenientes de dotações orçamentárias, inclusive suprimento de fundos, para atendimento de gastos com aquisição ou assinaturas de revistas, jornais e periódicos, salvo os de natureza estritamente técnica e os considerados necessários, para o serviço, bem assim como cartões, brindes, convites e outros dispêndios congêneres, de natureza pessoal”. (Destacamos.)
Nesse sentido, a Instrução Normativa nº 09/2012, da SLTI do MPOG, que regulamentou a disposição acima, estabelece também ser “vedada a realização de despesas com recursos provenientes de dotações orçamentárias, inclusive suprimento de fundos, para atendimento de gastos com aquisição ou assinaturas de revistas, jornais e periódicos, salvo os de natureza estritamente técnica e os considerados necessários, para o serviço, bem assim como cartões, brindes, convites e outros dispêndios congêneres, de natureza pessoal.” (art. 2º – destacamos).
3 Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU, 4. ed. Brasília: TCU, 2010, p. 722.
Nesse mesmo sentido, confira o material disponível no Zênite Fácil: “O que se deve entender por serviços contínuos para efeito de aplicação do art. 57, inc. II, da Lei nº 8.666/93?”, veiculado na Revista Zênite – Informativo de Licitações e Contratos (ILC), Seção Perguntas e respostas, nº 201, nov/2010, p. 1151).
4 Contratação de serviços essenciais e habituais – Aplicabilidade do art. 57, inc. II, da Lei nº 8.666/1993. Revista Zênite ILC – Informativo de Licitações e Contratos, Curitiba: Zênite, n. 288, p. 154-158, fev. 2018, seção Orientação Prática.
5 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratações Administrativas: Lei nº 14.133/21. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. p. 167 e 168.
6 Zênite Fácil. Disponível em: http://www.zenitefacil.com.br. Categoria Anotações, Lei nº 14.133/21, nota ao art. 6º, inc. XV. Acesso em: 29 ago. 2023.
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Como citar o conteúdo do Blog Zênite:
ZÊNITE, Equipe Técnica. Nova Lei de Licitações: aquisição anual de brindes e a impossibilidade de sua caracterização como fornecimento contínuo. Blog Zênite. 21 out. 2025. Disponível em: https://zenite.blog.br/nova-lei-de-licitacoes-aquisicao-anual-de-brindes-e-a-impossibilidade-de-sua-caracterizacao-como-fornecimento-continuo/. Acesso em: dd mmm. aaaa.
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