Exigência de pneus de fabricação nacional

Licitação

Questão apresentada à Equipe de Consultores da Zênite:

“É possível realizar licitação para aquisição de pneus fabricados no Brasil?”

Nos termos do caput do art. 3º da Lei n° 8.666/1993, “a licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração e a promoção do desenvolvimento sustentável”.

Nesse sentido, toda e qualquer exigência feita pela Administração em uma licitação deve, além de ser constitucional e legal, limitar-se ao estritamente necessário, porque exigências excessivas poderão restringir seu caráter competitivo, inserindo-se nas vedações impostas pelo inc. I do § 1º do art. 3º da Lei nº 8.666/1993.

Com o objetivo de não restringir o universo de competidores que teriam condições de fornecer satisfatoriamente os objetos da licitação, como regra, a Administração não poderá inserir, no edital, cláusula que determine que o produto a ser adquirido deverá ter “procedência nacional”, sob pena de o procedimento licitatório ser atingido pela ilegalidade, dando causa à nulidade.

Você também pode gostar

Isso porque haverá clara restrição ao caráter competitivo da licitação se restar comprovado que os produtos importados atenderiam de forma satisfatória ao interesse público buscado com a contratação.

A título exemplificativo, o TCU, no Acórdão nº 2.241/2011 do Plenário, determinou à SEGECEX que: (a) constitua grupo de trabalho para a análise das repercussões geradas pela Lei nº 12.349/2010 e (b) que o órgão jurisdicionado se abstivesse de “promover licitações, cujo objeto seja exclusivamente de fabricação nacional, até que este Tribunal delibere sobre a questão” (Grifamos). Há outras manifestações do TCU no mesmo sentido: Comunicação ao Plenário, TC 037.779/2011-7, Rel. Min. Ana Arraes, 18.01.2011; Acórdão nº 3.769/2012, 2ª Câmara, Rel. Min. Aroldo Cedraz, j. em 31.05.2012.

Esse tipo de restrição poderia ser admitida somente se estivesse fundada em justificativa técnica específica, formalizada em laudo elaborado por setor especializado, a qual demonstre a inadequação do objeto cuja restrição se pretende, levando-se em conta sua utilização e a relação custo-benefício, de modo a afastar futura contestação por parte dos órgãos de controle interno e externo da Administração.

No entanto, se a intenção é afastar eventuais produtos de qualidade duvidosa, é possível exigir que os pneus a serem ofertados para a Administração sejam certificados pelo Inmetro. Isso porque, conforme as informações constantes do site do próprio Inmetro, o uso da marca do Inmetro no flanco dos pneus é obrigatória. Nessa hipótese, o pneu a ser fornecido para a Administração, necessariamente, terá passado por testes de qualidade e conterá a aprovação do Inmetro para os fins a que se destina.

Em cartilha do TCE/MG (2012, p. 23, também há orientação nesse sentido: “Todo pneu vendido no Brasil tem que ter a estampa do INMETRO. A ausência do selo significa a ausência de aprovação para uso no Brasil”.

Que tal conhecer os 40 vícios + comuns nas contratações e se capacitar para evitá-los?

[Blog da Zênite] Exigência de pneus de fabricação nacional

Nessa direção, os pneus fabricados no Brasil e os importados que tiverem a estampa do Inmetro têm qualidade aprovada para a utilização, de modo que, não compete à Administração afastar do universo de competidores os pneus importados, sob pena de restringir o caráter competitivo e viciar de ilegalidade a licitação, salvo, por certo, se amparado em ampla justificativa técnica, formalizada em laudo por especialista.

Por fim, o art. 3º, § 5º, inc. I, da Lei de Licitações assim dispõe:

Art. 3º

[…]

§ 5º  Nos processos de licitação, poderá ser estabelecida margem de preferência para:                            

I – produtos manufaturados e para serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras; (Grifamos)

Dessa forma, cremos que a Lei de Licitações deixa para a discricionariedade administrativa a decisão de estabelecer referidas margens de preferência nas licitações, a ser fixada nos termos do art. 3º, §§ 5º a 15, da Lei nº 8.666/1993 e do Decreto nº 7.546/2011.

E o § 8º do art. 3º da Lei de Licitações ainda estabelece:

Art. 3º […]

[…]

§ 8º As margens de preferência por produto, serviço, grupo de produtos ou grupo de serviços, a que se referem os §§ 5º e 7º, serão definidas pelo Poder Executivo federal, não podendo a soma delas ultrapassar o montante de 25% (vinte e cinco por cento) sobre o preço dos produtos manufaturados e serviços estrangeiros. (Grifamos.)

De acordo com esse regime, decretos específicos do Poder Executivo instituem as margens de preferência para produtos e serviços nacionais, criando um diferencial de preços entre os produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais e os produtos manufaturados estrangeiros e serviços estrangeiros, o que permite assegurar preferência à contratação de produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais, mesmo quando custarem mais caro que os estrangeiros.

Essa disciplina legal foi regulamentada pelo Decreto nº 7.546/2011, que estabelece, em seu art. 3º, o alcance dessas medidas:

Art. 3º Nas licitações no âmbito da administração pública federal será assegurada, na forma prevista em regulamentos específicos, margem de preferência, nos termos previstos neste Decreto, para produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais que atendam, além dos regulamentos técnicos pertinentes, a normas técnicas brasileiras, limitada a vinte e cinco por cento acima do preço dos produtos manufaturados estrangeiros e serviços estrangeiros.

§ 1º Para os fins deste Decreto, entende-se como administração pública federal, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União.

§ 2º Os estados, o Distrito Federal, os municípios e os demais poderes da União poderão adotar as margens de preferência estabelecidas pelo Poder Executivo federal, previstas nos §§ 5º e 7º do art. 3º da Lei nº 8.666, de 1993. (Grifamos.)

Contudo, caso inexista regulamentação de margem de preferência para o objeto licitado, in casu, pneus, sua adoção estará inviabilizada.

A título exemplificativo, o Tribunal de Contas da União, em resposta à consulta formulada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), assim registrou:

9.2.1. é ilegal o estabelecimento de vedação a produtos e serviços estrangeiros em edital de licitação, uma vez que a Lei nº 12.349/2010 não previu tal restrição;

9.2.2. é ilegal o estabelecimento, por parte de gestor público, de margem de preferência nos editais licitatórios para contratação de bens e serviços sem a devida regulamentação via decreto do Poder Executivo Federal, estabelecendo os percentuais para as margens de preferência normais e adicionais, conforme o caso, e discriminando a abrangência de sua aplicação; (TCU, Acórdão 1.150/2013, Plenário, grifamos.)

No mesmo sentido é o teor de acórdão do Tribunal de Contas do Estado do Paraná:

Representação da Lei nº 8.666/1993 – Pregão Presencial – Fornecimento de pneusUtilização de margem de preferência para pneus de fabricação nacional – Necessidade de Decreto do Poder Executivo Federal – Carência de regulamentação para o objeto – Pela procedência e determinação – Ausência de dolo ou má-fé do gestor – Não constatado prejuízo ao erário e aos licitantes – Sem aplicação de multa administrativa. I. É vedado ao gestor público estabelecer margem de preferência para produtos nacionais não regulamentados pelo Poder Executivo Federal (Inteligência do artigo 3º, § 8º, da Lei n.º 8.666/1993); II. Procedência e determinação” (TCE/PR, Acórdão nº 284/2016, Plenário, grifamos.)

Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Zênite, de caráter opinativo e orientativo, elaborada de acordo com os subsídios fornecidos pela Consulente.

[Blog da Zênite] Exigência de pneus de fabricação nacional
Continua depois da publicidade
Seja o primeiro a comentar
Utilize sua conta no Facebook ou Google para comentar Google

Assine nossa newsletter e junte-se aos nossos mais de 100 mil leitores

Clique aqui para assinar gratuitamente

Ao informar seus dados, você concorda com nossa política de privacidade

Você também pode gostar

Continua depois da publicidade

Colunas & Autores

Conheça todos os autores
Conversar com o suporte Zênite