Considerações sobre a recondução do servidor ao cargo anterior por desistência do estágio probatório de cargo atual: “recondução a pedido”

Regime de Pessoal

Trata-se a recondução de forma de provimento de cargo público prevista pela Lei nº 8.112/90, nos termos de seu artigo 29, in verbis: “Art. 29.  Recondução é o retorno do servidor estável ao cargo anteriormente ocupado e decorrerá de: I – inabilitação em estágio probatório relativo a outro cargo; II – reintegração do anterior ocupante.” Conforme se lê, o dispositivo estabelece, em seus incisos, duas hipóteses expressas que ensejam o retorno do servidor estável a seu cargo anterior, quais sejam, sua inabilitação em estágio probatório referente a novo cargo no qual tenha sido empossado e a reintegração ao serviço público do antigo ocupante de seu cargo.

Ante a concisão das hipóteses legais expressas e a multiplicidade de situações fáticas possíveis na vida funcional do servidor, é possível cogitar-se se também seria assegurado ao servidor estável a recondução quando voluntariamente escolha desligar-se do novo cargo ao qual ainda esteja sujeito a estágio probatório. Assim, questiona-se se há direito à recondução a quem desiste do estágio probatório ou somente àquele considerado inapto na avaliação de desempenho realizada ao final do estágio probatório (“inabilitado”).

A resposta a esta indagação depende da análise da premissa adotada no precitado art. 29, inciso I, qual seja, a manutenção do vínculo do servidor com o cargo de origem até sua estabilização em novo cargo. Com efeito, a possibilidade de retorno ao cargo anteriormente ocupado no caso da recondução por inabilitação em estágio probatório funda-se no fato de que o vínculo de estabilidade com o antigo cargo somente será rompido pela estabilização no novo cargo público.

Analisando a situação proposta, conclui-se, que, de fato, a premissa subjacente ao art. 29, inciso I é igualmente válida para casos em que o servidor desiste de completar o estágio probatório em novo cargo, desde que tal desistência opere-se antes de sua estabilização mediante a aprovação no estágio pertinente ao novo cargo, uma vez que também nestes casos  o vínculo do servidor com o cargo anterior ainda não se teria desfeito pela estabilização no novo cargo.

A compreensão ora exposta, que evidencia a importância da interpretação do enunciado em detrimento de sua mera aplicação literal, é adotada pela jurisprudência dos Tribunais Superiores, conforme se observa das ementas a seguir:

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTÁVEL. ESTÁGIO PROBATÓRIO. Lei 8.112, de 1990, art. 20, § 2º. I. – Servidor Público, aprovado em concurso público, estável, que presta novo concurso e, aprovado, é nomeado para novo cargo. Durante o estágio probatório neste último cargo, requer sua recondução ao cargo anterior. Possibilidade, na forma do disposto no art. 20, § 2º, da Lei 8.112/90. É que, enquanto não confirmado no estágio do novo cargo, não estará extinta a situação anterior. II. – Precedentes do STF: MS 22.933-DF, Ministro O. Gallotti, Plenário, 26.6.98, “DJ” de 13.11.98; MS 23.577-DF, Ministro C. Velloso, Plenário, 15.05.2002, “DJ” de 14.06.02. III. – Mandado de segurança deferido.” (MS 24271/DF, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 20.09.2002.)

“ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. VACÂNCIA E RECONDUÇÃO. DESISTÊNCIA DO ESTÁGIO PROBATÓRIO DO CARGO DE AGENTE DA POLÍCIA FEDERAL. RETORNO AO CARGO DE PROFESSOR DA SECRETARIA ESTADUAL. CABIMENTO. 1. Diante da Resolução do Governador de Estado que declara a vacância do cargo de Professor do Impetrante em face de posse em outro cargo inacumulável, a mera alegação do Impetrado, sem qualquer comprovação, de que o servidor não era estável, não tem o condão de elidir a condição de servidor estável do Impetrante para fins de recondução ao cargo anteriormente ocupado. 2. Segundo entendimento deste Superior Tribunal de Justiça, o servidor que desiste do estágio probatório, ainda que não tenha sido regularmente inabilitado, tem o direito de ser reconduzido ao cargo anteriormente ocupado. Precedente. 3. Recurso ordinário conhecido e provido. “ (RMS 30973/PI, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 01.02.2012.)

Da mesma forma, tal entendimento é adotado no âmbito da Administração Pública Federal conforme se observa da Súmula nº 16 da AGU, de seguinte teor: “O servidor estável investido em cargo público federal, em virtude de habilitação em concurso público, poderá desistir do estágio probatório a que é submetido com apoio no art. 20 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, e ser reconduzido ao cargo inacumulável de que foi exonerado, a pedido.”

Da análise aqui apresentada conclui-se que, mesmo em matéria de servidor público, em que o princípio da legalidade mostra-se proeminente, com um regramento minucioso da vida funcional do servidor, não se dispensa a atuação do intérprete para conformar situações fáticas que, conquanto não previstas literalmente pelo enunciado/texto legal, mostram-se em perfeito alinhamento ao valor que a norma jurídica pretende tutelar.

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