Empresa beneficiária da ata de RP é suspensa pelo órgão gerenciador em razão da execução de outro contrato. O gerenciador poderá cancelar a ata e impedir futuras contratações dos órgãos participantes com a empresa sancionada?

Registro de Preços

Uma das situações que, na forma do inc. III do art. 3º do Decreto nº 7.892/13, autoriza a instituição de atas de registro de preços é quando essa prática “for conveniente a aquisição de bens ou a contratação de serviços para atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo”.

Nesse caso, a ata será integrada pelo órgão gerenciador, assim entendido o órgão ou a entidade responsável pela condução do conjunto de procedimentos para registro de preços e gerenciamento da ata de registro de preços dele decorrente, e pelos órgãos participantes, assim considerados os órgãos ou as entidades que participam dos procedimentos iniciais do Sistema de Registro de Preços e, tal qual o gerenciador, integram a ata de registro de preços possuindo quantitativos do objeto registrado para seu consumo próprio.

Significa dizer que, em situações dessa espécie, tanto o órgão gerenciador quanto os órgãos participantes possuem quantitativos do objeto registrado próprios, reservados para seu consumo. Não por outra razão, o edital de licitação para a instituição da ata deverá prever a “estimativa de quantidades a serem adquiridas pelo órgão gerenciador e pelos órgãos participantes” (art. 9º, inc. II, do Decreto nº 7.892/13).

Ao órgão gerenciador, no entanto, compete promover todos os atos necessários à instrução processual para a instituição da ata, inclusive e especialmente consolidar as informações relativas às estimativas individual e total de consumo, promovendo a adequação do termo de referência ou projeto básico para assegurar a padronização e racionalização da solução a ser registrada, além de realizar a pesquisa de mercado para identificação do valor estimado da licitação. De igual forma, também lhe compete realizar o procedimento licitatório, celebrar a ata de registro de preços e gerenciá-la durante sua vigência.

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Contudo, é importante deixar claro que, firmada a ata, os órgãos participantes terão para si assegurados os quantitativos registrados conforme indicado na fase de planejamento do procedimento e serão competentes pela celebração e gestão de seus próprios contratos, sem qualquer submissão ou interferência do órgão gerenciador.

Justamente por isso, celebrada a ata de registro de preços, o Decreto nº 7.892/13 prevê, no seu art. 5º, inc. X, que o órgão gerenciador será competente para

aplicar, garantida a ampla defesa e o contraditório, as penalidades decorrentes do descumprimento do pactuado na ata de registro de preços ou do descumprimento das obrigações contratuais, em relação às suas próprias contratações.

No § 1º de seu art. 6º, o regulamento estabelece que caberá a cada órgão participante

aplicar, garantida a ampla defesa e o contraditório, as penalidades decorrentes do descumprimento do pactuado na ata de registro de preços ou do descumprimento das obrigações contratuais, em relação às suas próprias contratações, informando as ocorrências ao órgão gerenciador.

Como se vê, depois de firmada a ata de registro de preços, não cabe ao órgão gerenciador interferir na formação e gestão dos contratos que dela poderão advir pelos órgãos participantes. Reconhece-se, assim, autonomia dos órgãos participantes em relação ao órgão gerenciador no que diz respeito à utilização da ata e contratação dos quantitativos que lhes foram previstos.

A partir desse cenário, na situação em exame, entende a Consultoria Zênite que a aplicação de sanções deve produzir efeitos sobre a ata de registro de preços de acordo com a extensão e o alcance da sanção aplicada. Explica-se.

Tal como informa o entendimento sedimentado nos últimos anos pela jurisprudência do Tribunal de Contas da União, a Consultoria Zênite entende que:

a penalidade de suspensão temporária/impedimento de contratar, prevista no art. 87, inciso III, da Lei 8.666/1993, incide sobre a Administração, isto é, somente em relação ao órgão ou à entidade contratante, nos termos em que decidiu o Tribunal no Acórdão 3243/2012- Plenário. (TCU, Acórdão nº 3.439/2012, Plenário.)

A principal razão que ampara essa conclusão decorre do fato de que a aplicação de sanções deve ocorrer sempre com base em interpretação restritiva. Na medida em que a Lei nº 8.666/93 alude à “suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração”, os efeitos dessa penalidade devem se restringir à “Administração”, que, na forma do inc. XII do art. 6º da citada Lei, deve ser compreendida como “órgão, entidade ou unidade administrativa pela qual a Administração Pública opera e atua concretamente”.

Para a Corte de Contas, conforme os mesmos precedentes, a empresa somente estaria impedida de licitar e contratar com todos os órgãos e as entidades da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios se a ela tivesse sido aplicada a penalidade de declaração de inidoneidade para licitar e contratar com a Administração Pública, prevista no inc. IV do mesmo art. 87.

Isso porque, nesse caso, a Lei nº 8.666/93 instituiu a declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública, cabendo compreender por “Administração Pública”, na forma do inc. XI do seu art. 6º,

a administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, abrangendo inclusive as entidades com personalidade jurídica de direito privado sob controle do poder público e das fundações por ele instituídas ou mantidas.

Destaca-se que, também de acordo com a interpretação adotada pelo Tribunal de Contas da União no Acórdão nº 2.081/2014 – Plenário,

a sanção de impedimento de licitar e contratar pautada no art. 7º da Lei 10.520/02 (Lei do Pregão) produz efeitos não apenas no âmbito do órgão/entidade aplicador da penalidade, mas em toda a esfera do respectivo ente federativo (União ou estado ou município ou Distrito Federal).

Para a Consultoria Zênite, é à luz desses efeitos e das circunstâncias que envolveram a instituição da ata na situação em análise que a disciplina constante do inc. IV do art. 20 do Decreto nº 7.892/13 precisa ser interpretada e aplicada:

Art. 20. O registro do fornecedor será cancelado quando:

(…)

IV – sofrer sanção prevista nos incisos III ou IV do caput do art. 87 da Lei nº 8.666, de 1993, ou no art. 7º da Lei nº 10.520, de 2002.

Ou seja, não basta simplesmente a empresa beneficiária “sofrer sanção prevista nos incisos III ou IV do caput do art. 87 da Lei nº 8.666, de 1993, ou no art. 7º da Lei nº 10.520, de 2002”, para que seu registro seja totalmente cancelado. A depender da sanção aplicada, o cancelamento do registro ocorrerá em face de um, de alguns ou de todos os órgãos que integram essa ata, conforme o alcance da penalidade imposta.

Desse modo, como no caso em exame o órgão gerenciador aplicou a sanção prevista no art. 87, inc. III, da Lei nº 8.666/93 – suspensão do direito de licitar e contratar com a Administração, tendo em vista que os efeitos decorrentes dessa sanção impedem a empresa de licitar e contratar somente em relação ao órgão ou à entidade que aplicou a penalidade, e considerando a autonomia dos órgãos participantes em relação ao órgão gerenciador, conclui-se que o impedimento de licitar e contratar alcança apenas o órgão gerenciador, de modo a continuar sendo possível aos órgãos participantes acionar a ata para firmar contratos com a empresa beneficiária, razão pela qual não se vislumbra fundamento para operar o cancelamento integral do registro.

Nota: Esse material foi originalmente publicado na Revista Zênite – Informativo de Licitações e Contratos, na seção Perguntas e Respostas. A Revista Zênite e o Zênite Fácil esclarecem as dúvidas mais frequentes e polêmicas referentes à contratação pública, nas seções Orientação Prática e Perguntas e Respostas. Acesse www.zenite.com.br e conheça essas e outras Soluções Zênite.


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