Recurso administrativo e a necessidade de análise de todas as razões apresentadas pelo recorrente  |  Blog da Zênite

Recurso administrativo e a necessidade de análise de todas as razões apresentadas pelo recorrente

Licitação

Questão apresentada à Equipe de Consultoria Zênite:

“Em julgamento de recursos interpostos por diversos licitantes em um pregão, a decisão deve enfrentar necessariamente todos os argumentos de fato e de direito apresentados nas contrarrazões? A ausência de enfrentamento específico de algum argumento fático configura nulidade da decisão?”

DIRETO AO PONTO

Em vista do exposto, conclui-se objetivamente:

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1) A motivação suficiente para garantir a validade de uma decisão proferida em sede de recurso administrativo deve cotejar todos os argumentos recursais para, contrabalanceando-os com os demais elementos de fato e de direito envolvidos no feito, acolhê-los ou afastá-los, destacando o conjunto de razões que amparam a decisão adotada.

2) Se a Administração não examinou todos os argumentos contidos nas razões recursais e que, na visão do recorrente, seriam aptos para resultar no provimento do recurso, a decisão pode ter sua validade questionada por deficiência de motivação. Para evitar esse risco, e assegurar a lisura e a segurança jurídica da decisão, é recomendável que a Administração, com o objetivo de convalidar a questão, emita um ato complementar examinando o ponto omitido no ato inicial e, por conseguinte, mantenha ou altere a decisão inicialmente proferida.

FUNDAMENTO

As decisões proferidas com o objetivo de resolver os recursos interpostos pelos particulares nos processos de contratação pública constituem atos administrativos. São, na verdade, atos administrativos de conotação decisória que, por conta disso, devem ser devidamente motivados.

Sobre a necessidade de tais atos serem adequadamente motivados, vale mencionar a regra prevista no art. 50, da Lei nº 9.784/99, a título referencial1:

“Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:

(…).

V – decidam recursos administrativos;” (Destacamos.)

Acerca do tema, vale mencionar a experiência jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça:

“ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO NA CORTE DE ORIGEM. CONCURSO PÚBLICO PARA DELEGADO DA POLÍCIA CIVIL DO DISTRITO FEDERAL. NEGATIVA DE ACESSO AOS CRITÉRIOS UTILIZADOS NA CORREÇÃO DA PROVA SUBJETIVA. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO DA BANCA EXAMINADORA ACERCA DOS RECURSOS ADMINISTRATIVOS CONTRA REFERIDA PROVA. VIOLAÇÃO AO ART. 50 DA LEI 9.784/99. RECURSOS ESPECIAIS PROVIDOS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A motivação, nos recursos administrativos referentes a concursos públicos, é obrigatória e irrecusável, nos termos do que dispõe o art. 50, I, III e V, §§ 1º e 3º da Lei 9.784/99, não existindo, neste ponto, discricionariedade alguma por parte da Administração. 2. Com relação ao Impetrante JOÃO GUILHERME MEDEIROS CARVALHO salta aos olhos a total ausência de motivação na correção das provas discursivas e nos respectivos recursos administrativos. Há apenas suposições, externadas pelos ilustres relator e revisor do feito em segundo grau, de que os apelos administrativos do Impetrante foram examinados e devidamente motivados, não tendo sido apresentadas, entretanto, motivações idôneas e circunstanciadas, nos moldes preconizados pelo já mencionado art. 50 da Lei 9.784/99. 3. Quanto aos demais litisconsortes (JANE KLÉBIA DO NASCIMENTO SILVA PAIXÃO E OUTROS), constata-se a ausência de qualquer elemento que pudesse ter o condão de indicar os critérios utilizados pelo examinador para aferição das notas na prova subjetiva, bem como a sucinta, lacônica e estereotipada abordagem feita na revisão das provas. 4. Afirmativas que não traduzem reexame do material fático, mas sim valoração do conjunto probatório trazido aos autos quando da impetração do Mandado de Segurança. 5. Agravo Regimental desprovido.” (STJ, Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1062902-DF, 2008/0121725-5, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Data de Julgamento: 09/06/2009, Quinta Turma, Data de Publicação: DJe 03/08/2009.)

No âmbito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal verifica-se precedente no mesmo sentido:

“PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. PROVA. DISCURSIVA. RECURSO. INDEFERIMENTO. RESPOSTA. SUCINTA. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE RESPOSTA. ILEGALIDADE. 1. É vedado ao Poder Judiciário, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal na análise do Tema de Repercussão Geral nº 485, imiscuir-se nos critérios de correção da banca examinadora, sob pena de adentrar no mérito administrativo. 2. O artigo 50, inciso V e § 1º, da Lei nº 9.784/1999 exige motivação explícita, clara e congruente para atos que decidam recursos administrativos. 3. A decisão de banca examinadora de concurso público que indefere recurso interposto em face do resultado provisório de prova discursiva deve obediência ao artigo 50 da Lei 9.784/1999. 4. O fato de a motivação para o indeferimento de recurso administrativo ter sido sucinta não implica em ausência de motivação ou de fundamentação. Precedentes TJDFT. 5. A total ausência de resposta para o indeferimento de recurso interposto contra o resultado provisório de prova discursiva de concurso público implica em flagrante ilegalidade por violar a necessidade de motivação de atos que decidam recursos administrativos. 6. Recurso conhecido e parcialmente provido.” (TJ-DF 07175853220228070018 1705063, Relator: MARIA DE LOURDES ABREU, Data de Julgamento: 18/05/2023, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: 02/06/2023)

A motivação de um ato administrativo que decide um recurso interposto por particulares nos processos de contratação pública, para que seja suficiente, deverá ser clara, congruente e explícita (art. 50, § 1º, da Lei nº 9.784/99)2. Essas características apenas são obtidas quando a integralidade dos argumentos apresentados pelos interessados para alterar a decisão recorrida são analisados e acolhidos ou refutados. Em outras palavras, a motivação suficiente para garantir a validade de uma decisão proferida em sede de recurso administrativo deve cotejar todos os argumentos recursais para, contrabalanceando-os com os demais elementos de fato e de direito envolvidos no feito, acolhê-los ou afastá-los, destacando o conjunto de razões que amparam a decisão adotada.

Nesse sentido:

“A motivação nada mais é que uma justificativa dos atos administrativos a partir de fundamentos de fato e de direito, permitindo uma comparação entre os eventos acontecidos e as providências tomadas pela Administração Pública. Como consequência lógica, a motivação funciona como pressuposto ao exercício do contraditório e à ampla defesa pelos administrados, dando subsídio fático e jurídico a eventual propositura de recurso administrativo.”3

No presente caso, se a Administração não examinou todos os argumentos contidos nas razões recursais e que, na visão do recorrente, seriam aptos para resultar no provimento do recurso, a decisão pode ter sua validade questionada por deficiência de motivação. Para evitar esse risco, e assegurar a lisura e a segurança jurídica da decisão, é recomendável que a Administração, com o objetivo de convalidar a questão, emita um ato complementar examinando o ponto omitido no ato inicial e, por conseguinte, mantenha ou altere a decisão inicialmente proferida.

NOTAS E REFERÊNCIAS

A jurisprudência dos tribunais superiores orientou-se no sentido de que, ausente norma local disciplinando o processo administrativo, a Lei nº 9.784/1999 deverá ser observada tanto por Estados, quanto por Municípios:

“ADMINISTRATIVO. DESPACHANTE. CASSAÇÃO DE LICENÇA PARA EXERCÍCIO. DEVIDO PROCESSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE REVISÃO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. LEI FEDERAL 9.784/1999. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA AOS ESTADOS E MUNICÍPIOS. 1. Conforme consignado no acórdão recorrido, a Lei Estadual 13.327/1998, que regulamenta a atividade dos despachantes no Estado do Paraná, não prevê, nas disposições que cuidam do processo administrativo disciplinar, a existência do pedido de revisão das decisões que apliquem a penalidade de cassação de credencial do Despachante, mas tão somente de recurso ao Secretário de Estado da Segurança Pública, no prazo de 15 dias, o que foi feito pelo Recorrente. 2. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que a Lei 9.784/1999 pode ser aplicada de forma subsidiária no âmbito dos demais Estados Membros, se ausente lei própria que regule o processo administrativo local, o que não é o caso dos autos. 3. Ademais, dos documentos juntados aos autos, infere-se que o processo administrativo disciplinar ao qual foi submetido o agravante atendeu às exigências legais, tendo propiciado ao agravante o exercício de seu direito ao contraditório e à ampla defesa. O pedido de revisão, por sua vez, não traz fatos novos ou circunstâncias relevantes suscetíveis de justificar a inadequação da sanção aplicada. Assim, vê-se que a pretensão do agravante é, em verdade, discutir novamente matéria já decidida pela Administração Pública, por decisão definitiva. Não há, portanto, direito líquido e certo a ser amparado na hipótese dos autos. 4. Agravo Regimental não provido.” (STJ, AgRg no RMS nº 45176/PR, 2014/0055224-3, Rel. Min. Herman Benjamin, Data de Julgamento: 24/03/2015, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe 31/03/2015.)

2 “ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONCURSO PÚBLICO. PROVA DISCURSIVA. RECURSO ADMINISTRATIVO PARCIALMENTE PROVIDO, SEM A ATRIBUIÇÃO RESPECTIVA DOS PONTOS. NULIDADE. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA MOTIVAÇÃO, CONFIANÇA LEGÍTIMA DO ADMINISTRATO E VEDAÇÃO AO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. 1. Na forma da jurisprudência desta Corte, “a motivação do ato administrativo deve ser explícita, clara e congruente, vinculando o agir do administrador público e conferindo o atributo de validade ao ato. Viciada a motivação, inválido resultará o ato, por força da teoria dos motivos determinantes. Inteligência do art. 50, § 1.º, da Lei n. 9.784/1999” (RMS 59.024/SC, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 08/09/2020). 2. Sob esse aspecto, demonstrada a inexistência dos erros apontados no espelho de correção da prova, caberia à Administração não só o provimento do recurso quanto ao ponto, o que foi efetivamente feito, mas também a retirada da marcação dos respectivos erros, com a devida atribuição da pontuação respectiva, sendo certo que a ocorrência de eventual erros em outros pontos da prova não podem servir como justificativa para a não alteração da pontuação impugnada no recurso, sob pena de ofensa aos postulados legais invocados pela recorrente e aos princípios da motivação, da confiança legítima do administrado e da vedação do comportamento contraditório. Precedentes: AgInt no RMS 62.372/CE, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 24/09/2020; EDcl no RMS 48.678/SE, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 08/03/2017; AgRg no AREsp 500.567/CE, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 18/08/2014; AgInt no REsp 1.472.899/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, DJe 01/10/2020. 3. Recurso especial parcialmente provido, para determinar seja atribuída à recorrente a pontuação relativa à questão 3 da prova discursiva 3 do concurso em questão, com o consequente reposicionamento e, se for o caso, prosseguimento das demais fases do certame.” (STJ, Recurso Especial nº 1907044/GO, 2020/0313950-0, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Data de Julgamento: 10/08/2021, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe 25/08/2021.)

STJ, Recurso em Mandado de Segurança nº 68513/RJ, 2022/0074936-6, Rel. Min. Assusete Magalhães, Data de Publicação: DJ 27/06/2022.

 

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Como citar o conteúdo do Blog Zênite:
ZÊNITE, Equipe Técnica. Recurso administrativo e a necessidade de análise de todas as razões apresentadas pelo recorrente. Blog Zênite. 16 set. 2025. Disponível em: https://zenite.blog.br/recurso-administrativo-e-a-necessidade-de-analise-de-todas-as-razoes-apresentadas-pelo-recorrente/. Acesso em: dd mmm. aaaa.

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