No âmbito das contratações públicas, antes de celebrar um contrato a Administração deve definir com clareza o objeto pretendido. Logo após, deve efetuar a avaliação do seu custo em face das condições contemporâneas de mercado. O resultado dessa pesquisa realizada junto ao mercado fornecedor de bens e serviços é o que se denomina orçamento ou preço estimado da contratação.
Conforme leciona Joel de Menezes Niebuhr “O orçamento daquilo que se está licitando é ato fundamental para a condução de todo processo, especialmente para proceder ao controle dos preços propostos à Administração, se excessivos ou inexequíveis. Sem o orçamento, sem saber o quanto custa o que se está licitando, a Administração não dispõe de elementos para realizar tais controles, e, por consequência, passa a aceitar quaisquer tipos de valores, em detrimento ao interesse público.”[1]
No mesmo sentido, Renato Geraldo Mendes afirma que “O preço estimado tem fundamental importância para a contratação, pois é a partir dele que: a) será fixado o preço máximo; b) serão analisadas e julgadas as propostas; e c) será aplicado o critério de aferição do preço inexequível previsto no § 1º do art. 48 da Lei nº 8.666/93.”[2]
Não por outra razão, o legislador determinou a obrigatoriedade da publicação do orçamento estimado nas contratações decorrentes das modalidades previstas na Lei de Licitações. O art. 7º, §2º do referido diploma legal, condiciona o procedimento licitatório à existência de “orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os custos unitários”. Já o art. 40, § 2º, II, determina que a Administração faça constar como anexo obrigatório do edital o “orçamento estimado em planilha de quantitativos e preços unitários”.
Em se tratando de procedimento licitatório processado pela modalidade pregão, muito embora nem a Lei nº 10.520/02 e nem os Decretos regulamentadores da modalidade prevejam expressamente a obrigatoriedade de divulgação do orçamento estimado, com fundamento nos princípios norteadores das licitações públicas é possível inferir a necessidade de informá-lo no edital da licitação.[3]
No que tange ao Regime Diferenciado de Contratações Públicas, a disciplina dada à questão pela Lei nº 12.462/11, que institui o RDC, é nitidamente distinta do regime jurídico das contratações públicas vigente até então, já que prevê expressamente a possibilidade de não divulgação do orçamento previamente estimado pela Administração até o encerramento da licitação. É o teor do caput do art. 6º, segundo o qual:
Art. 6º Observado o disposto no § 3º, o orçamento previamente estimado para a contratação será tornado público apenas e imediatamente após o encerramento da licitação, sem prejuízo da divulgação do detalhamento dos quantitativos e das demais informações necessárias para a elaboração das propostas.
O dispositivo estabelece que o orçamento estimado poderá, em algumas hipóteses, ser mantido em sigilo até o encerramento da licitação, entendido como o ato de adjudicação do objeto, conforme preceitua o caput do art. 9º, do Decreto nº 7.581/11, que regulamenta o RDC.
Ou seja, o sigilo do preço estimado é facultado nos procedimentos efetivados sob a disciplina do RDC, mas não é a regra. Tal entendimento se infere da conjugação do caput com o §3º, do art. 6º da Lei nº 12.462/11, que determina o seguinte: “Se não constar do instrumento convocatório, a informação referida no caput deste artigo possuirá caráter sigiloso e será disponibilizada estrita e permanentemente aos órgãos de controle externo e interno.”
Além disso, a Lei do RDC traz duas hipóteses nas quais a divulgação do orçamento é obrigatória, descritas nos §§1º e 2º do art. 6º, conforme segue:
Art. 6º. (…)
§ 1º Nas hipóteses em que for adotado o critério de julgamento por maior desconto, a informação de que trata o caput deste artigo constará do instrumento convocatório.
§ 2º No caso de julgamento por melhor técnica, o valor do prêmio ou da remuneração será incluído no instrumento convocatório.
O Decreto nº 7.581/11, que regulamenta o regime diferenciado, possui as mesmas previsões. Os incisos do §2º do art. 9º preveem que o instrumento convocatório deverá conter: “I – o orçamento previamente estimado, quando adotado o critério de julgamento por maior desconto; II – o valor da remuneração ou do prêmio, quando adotado o critério de julgamento por melhor técnica ou conteúdo artístico; e III – o preço mínimo de arrematação, quando adotado o critério de julgamento por maior oferta.”
Ademais, o art. 27 do regulamento dispõe que “o critério de julgamento por maior desconto utilizará como referência o preço total estimado, fixado pelo instrumento convocatório.”
A partir dessas disposições, em que pese a existência de posicionamentos doutrinários em sentido diverso[4], entende-se que a legislação ora em análise aponta para a faculdade de divulgação ou não do orçamento estimado nas licitações disciplinadas pelo RDC e não seu caráter sigiloso. Conforme se demonstrou acima, o caput do artigo 6º assegura a observância do § 3º, segundo o qual a informação será confidencial “quando não constar do edital do certame”.
Outra não poderia ser a interpretação conferida ao dispositivo, haja vista o preço estimado tratar-se também de importante instrumento de controle popular dos gastos públicos. Do mesmo modo, tal raciocínio é consequência da diretriz que determina a observância do direito de acesso a informação, constante da Lei nº 12.527/11, que regula o previsto no inc. XXXIII do art. 5º, no inc. II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição da República.
De acordo com o art. 7º, inc. VI do referido diploma legal o acesso à informação compreende, entre outros, o direito de obter informações pertinentes à administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação e contratos administrativos. Embora a entrada em vigor da Lei nº 12.527/11 não obrigue a Administração à divulgação do orçamento estimado da licitação, reforça o dever de conceder vistas do processo administrativo que contém essa informação, se solicitado por licitante ou interessado.
Assim, a Administração poderá, sopesados a necessidade a ser satisfeita e o interesse público envolvido na contratação, avaliar a conveniência da divulgação ou não do preço estimado nas licitações do tipo menor preço disciplinadas pelo RDC. Por outro lado, será necessária a publicidade dessa informação nos certames que adotem como critério de julgamento o maior desconto ou no caso de julgamento por melhor técnica.
A par dessas conclusões é necessário observar que tanto a Lei nº 12.462/11 quanto o Decreto regulamentador estabelecem que o orçamento previamente estimado seja disponibilizado permanentemente aos órgãos de controle externo e interno.
Por fim, cumpre ainda ressaltar que a não divulgação do orçamento não se confunde com a desnecessidade de elaboração. Sabe-se que a definição do preço estimado da contratação é imprescindível para aferir a modalidade licitatória adequada e, inclusive, a possibilidade de eventual contratação direta; avaliar a disponibilidade orçamentária; e fixar critérios objetivos para o julgamento e aceitabilidade das ofertas, razão pela qual a Administração não está autorizada a dispensá-lo.
[1] NIEBUHR, JOEL DE MENEZES. Orçamento estimado. Revista Zênite – Informativo de Licitações e Contratos (ILC), Curitiba: Zênite, n. 165, p. 1065, nov. 2007, seção Doutrina.
[2] MENDES, Renato Geraldo. O processo de contratação pública: fases, etapas e atos. Curitiba: Zênite, 2012. p. 308.
[3] A Lei nº 10.520/02 prevê em seu art. 3º, inc. III, que o preço estimado é uma informação que deve constar necessariamente dos autos do processo administrativo da contratação e não do edital. Sobre o assunto o TCU, no voto constante do Acórdão nº 114/2007, Plenário, manifestou o entendimento de que: “(…) nas licitações na modalidade de pregão, os orçamentos estimados em planilhas de quantitativos e preços unitários – e, se for o caso, os preços máximos unitários e global – não constituem elementos obrigatórios do edital, devendo, no entanto, estar inseridos nos autos do respectivo processo licitatório. Caberá aos gestores/pregoeiros, no caso concreto, a avaliação da oportunidade e conveniência de incluir tais orçamentos – e os próprios preços máximos, se a opção foi a sua fixação – no edital, informando nesse caso, no próprio ato convocatório, a sua disponibilidade aos interessados e os meios para obtê-los..” (TCU, Acórdão nº 392/2011, Plenário, Rel. Min. José Jorge, DOU de 23.02.2011). Embora a Corte de Contas reconheça a possibilidade de não ser publicado o orçamento estimado no edital, ressalta o dever de nele constar informação do local onde os interessados poderão obtê-lo, haja vista qualquer interessado ter direito de acesso às estimativas de preço realizadas pela Administração.
[4] De acordo com o entendimento de Egon Bockmann Moreira e Fernando Vernalha Guimarães “A edição do RDC (instituído pela Lei 12.462/2011) trouxe uma regra que inova no Direito nacional a tradição quanto à ampla e prévia divulgação do orçamento na licitação. O caput do art. 6º da Lei 12.462/2011 estabeleceu a regra do orçamento sigiloso para as contratações regidas pelo RDC, que foi regulamentada no art. 9º do Decreto 7.581/2011 (Regulamenta o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC). MOREIRA, Egon Bockmann; GUIMARÃES, Fernando Vernalha. A lei geral de licitação – LGL e o regime diferenciado de contratação – RDC. São Paulo: Malheiros Editores, 2012, p. 156.