Nova Lei de Licitações: a substituição do contrato por outros documentos

Contratos AdministrativosNova Lei de Licitações

Questão apresentada à Equipe de Consultores Zênite:

“O art. 95, da Lei nº 14.133/2021 prevê a substituição do instrumento do contrato nas situações de ‘dispensa de licitação em razão do valor’ e de ‘compras com entrega imediata” dos quais ‘não resulte obrigações futuras’. Diante disso, indagamos como poderia ser fundamentada a substituição do termo de contrato por nota de empenho ou ordem de execução de serviço nas contratações, por exemplo, de capacitações/treinamentos por meio de inexigibilidade de licitação? Ou deverá haver contrato?”

DIRETO AO PONTO

Com base na interpretação sistemática e finalística do art. 95 da Lei nº 14.133/2021, entendemos que apesar da literalidade do inciso I deste artigo, é juridicamente possível a substituição do termo de contrato por nota de empenho ou ordem de execução de serviço nas contratações, por exemplo, de capacitações/treinamentos por meio de inexigibilidade de licitação, desde que o valor da contratação fique abaixo do limite para a contratação direta por dispensa de licitação em razão do valor previsto art. 75, inciso II, desta lei.

Lembrando que a ausência do instrumento de contrato não fragiliza a Administração, desde que haja processo administrativo de contratação adequadamente instruído, do qual constem todas as obrigações das partes, a exemplo de prazos, dentre outras condicionantes e, ainda, a proposta.

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Salvo melhor juízo, essa é a orientação da Zênite, de caráter opinativo e orientativo, elaborada de acordo com os subsídios fornecidos pela Consulente.

FUNDAMENTAÇÃO

A nova Lei de Licitações simplificou o instrumento a ser utilizado para formar relação contratual entre os órgãos e entidades da Administração Pública direta, autárquica e fundacional e terceiros.

Com no art. 95, o instrumento de contrato será obrigatório. Essa é a regra, mas não absoluta, já que o mesmo art. 95 admite a substituição do instrumento de contrato por outro instrumento hábil, como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço.

Por consequência lógica, para as contratações que ocorressem por licitação ou com base em outras hipóteses de dispensa e inexigibilidade de licitação – ainda que com valores inferiores aos limites para a dispensa de licitação em razão do valor (art. 75, incisos I e II) – não seria possível substituir o instrumento de contrato por outro instrumento hábil, como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço.

Porém, a conclusão acima não parece adequada para esta Consultoria. Isso porque, o método de interpretação literal não é o único e nem o melhor.

Em oposição ao método literal de interpretação, forma-se a interpretação sistemática, a qual, como leciona Maria Helena Diniz, “considera o sistema em que se insere a norma, relacionando-a com outras concernentes ao mesmo objeto. Isto é assim porque o sistema jurídico não se compõe de um só sistema de normas, mas de vários, que constituem um conjunto harmônico e interdependente, embora cada qual esteja fixado em seu lugar próprio.”2

Sob esse enfoque, esta Consultoria se inclina a entender que a melhor interpretação da norma contida no art. 95, inciso I da Lei nº 14.133/2021, é de que em se tratando de contratação com valor inferior ao limite admitido para a contratação direta por dispensa de licitação em razão do valor (art. 75, incisos I e II da Lei nº 14.133/2021), independentemente do procedimento adotado para promover a seleção do contratado – licitação ou contratação direta por dispensa e inexigibilidade de licitação, e ainda que a execução não ocorra de forma imediata e integral e da qual resultem obrigações futurasserá possível substituir o instrumento de contrato por outro instrumento hábil.

Essa compreensão se forma por se possível identificar, no art. 95 da Lei nº 14.133/2021, a adoção de 2 critérios pelo legislador para excepcionar a regra, para admitir a substituição do instrumento de contrato por outro instrumento hábil, mais simples, quais sejam:

– no inciso I, o caráter econômico da contratação, ou seja, contratos com valores inferiores aos limites admitidos para a contratação direta por dispensa de licitação em razão do valor (art. 75, incisos I e II da Lei nº 14.133/2021); e

– no inciso II, independentemente do valor da contratação, a simplicidade das obrigações contratadas e a ausência de risco, o que ocorre nas compras com entrega imediata e integral dos bens adquiridos e dos quais não resultem obrigações futuras, inclusive quanto a assistência técnica.

Desse modo, ainda que o contrato tenha sido firmado por licitação, por dispensa de licitação com base nas hipóteses previstas nos incisos III e seguintes do art. 75 da Lei nº 14.133/2021, ou por inexigibilidade de licitação, desde que o seu valor seja inferior aos limites admitidos para a contratação direta por dispensa de licitação em razão do valor (art. 75, incisos I e II da Lei nº 14.133/2021), o caráter econômico da contratação se insere na previsão contida no inciso I do art. 95 da Lei nº 14.133/2021.

Ao que nos parece, essa mesma racionalidade orientou a Advocacia Geral da União ao abordar as hipóteses de dispensa de parecer jurídico prévio. Ao considerar o caráter econômico da contratação, incluiu a possibilidade de dispensa de parecer jurídico prévio nas contratações diretas fundadas em inexigibilidade, contanto que o valor pertinente estivesse abarcado pelo limite da dispensa em razão do valor. Confira:

ORIENTAÇÃO NORMATIVA AGU Nº 69, DE 13 DE SETEMBRO DE 2021(*)

O ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO, no uso das atribuições que lhe confere o art. 4º, incisos I, X, XI, XIII, e XVIII, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, e considerando o que consta do Processo Administrativo nº 63054.001894/2021-82, resolve expedir a presente Orientação Normativa a todos os órgãos jurídicos enumerados nos arts. 2º e 17 da Lei Complementar nº 73, de 1993:

NÃO É OBRIGATÓRIA MANIFESTAÇÃO JURÍDICA NAS CONTRATAÇÕES DIRETAS DE PEQUENO VALOR COM FUNDAMENTO NO ART. 75, I OU II, E § 3º DA LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021, SALVO SE HOUVER CELEBRAÇÃO DE CONTRATO ADMINISTRATIVO E ESTE NÃO FOR PADRONIZADO PELO ÓRGÃO DE ASSESSORAMENTO JURÍDICO, OU NAS HIPÓTESES EM QUE O ADMINISTRADOR TENHA SUSCITADO DÚVIDA A RESPEITO DA LEGALIDADE DA DISPENSA DE LICITAÇÃO. APLICA-SE O MESMO ENTENDIMENTO ÀS CONTRATAÇÕES DIRETAS FUNDADAS NO ART. 74, DA LEI Nº 14.133, DE 2021, DESDE QUE SEUS VALORES NÃO ULTRAPASSEM OS LIMITES PREVISTOS NOS INCISOS I E II DO ART. 75, DA LEI Nº 14.133, DE 2021. (Destacamos.)

Interessante observar que, o entendimento pela possibilidade de dispensar o instrumento de contrato nas hipóteses citadas não parece fragilizar a Administração.

Afinal, todo contrato, seja fruto de licitação ou contratação direta, pressupõe prévia e correta instrução processual, da qual constem as decisões da Administração acerca dos requisitos da contratação, expressos no edital ou, no caso de contratação direta, nos estudos preliminares e/ou termo de referência, bem como em eventuais projetos, e que vinculam a análise e a aceitabilidade da proposta a ser contratada. Por sua vez, o contrato, formalizado por instrumento contratual ou não, vincula-se ao edital/termo de referência, bem como à proposta. E sempre é recomendado (o que já retrata uma praxe administrativa em alguns órgãos e entidades) incluir um anexo ao instrumento substitutivo, contemplando obrigações gerais, prazos e sanções para a hipótese de mora e inadimplemento.

Aliás, a necessária vinculação entre o contrato (instrumento de contrato ou instrumentos substitutivos) e os termos do edital/ato que autorizou a contratação direta e a proposta, encontra-se expressa no art. 89, § 2º, da Lei nº 14.133/2021.

Reforçando a necessidade de preservar a disciplina clara das condições de execução e demais obrigações previstas nos documentos de planejamento, na proposta e no anexo do substitutivo, importante destacar o §1º do art. 95:

Art. 95. O instrumento de contrato é obrigatório, salvo nas seguintes hipóteses, em que a Administração poderá substituí-lo por outro instrumento hábil, como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço:

(…)

§1º Às hipóteses de substituição do instrumento de contrato, aplica-se, no que couber, o disposto no art. 92 desta Lei. (Destacamos.)

Essas são as diretrizes gerais a respeito do tema. Mas pode ocorrer, por exemplo, uma dispensa em razão do valor para contratação de pequena obra de engenharia, com fundamento o art. 75, inc. I, o agente público optar por formalizar o ajuste por instrumento de contrato em função dos riscos envolvidos e da complexidade do escopo. E nenhuma irregularidade incidirá pela adoção dessa postura cautelosa.

Atente-se, contudo, que não se deve deixar de considerar a possibilidade de os órgãos de controle externo empregarem interpretação restritiva da hipótese descrita no art. 95 da Lei nº 14.133/2021 e, a exemplo do que ocorreu com o disposto no art. 62, caput c/c § 4º da Lei nº 8.666/1993, exigirem a ausência de obrigações futuras para autorizar a substituição do instrumento de contrato por outros instrumentos hábeis, mesmo quando o contrato possuir valor inferior aos limites admitidos para a contratação direta por dispensa de licitação em razão do valor (art. 75, incisos I e II da Lei nº 14.133/2021).

Nesse sentido, citamos a orientação adotada pelo Tribunal de Contas da União para o art. 62, caput c/c § 4º da Lei nº 8.666/1993, no Acórdão nº 3.352/2015 – Plenário.


[Blog da Zênite] Nova Lei de Licitações: a substituição do contrato por outros documentos

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