O dever de planejamento é tema que tem ganhado grande relevância no âmbito da contratação pública. Felizmente, a questão vem sendo amplamente debatida pelos agentes públicos e também no âmbito dos Órgãos de Controle, que destacam a necessidade premente de contratações mais eficientes. Há 25 anos atuando no mercado, a Zênite sempre defendeu o planejamento como fator determinante para o sucesso de qualquer contratação.
Para tanto, é fundamental que a Administração realize essa etapa de forma detalhada, pois a identificação correta de sua necessidade é essencial para a escolha da melhor solução. Para o autor Renato Geraldo Mendes, a etapa de planejamento deve responder a três perguntas fundamentais: “Qual o problema a ser resolvido? Qual a solução para resolver o problema? Quanto custa a solução definida para resolver o problema identificado?”.[1]
Responder adequadamente a essas perguntas e conduzir essa etapa de forma adequada evita a ocorrência de falhas na fase de seleção do particular (fase externa) e na condução do contrato (fase contratual). Aliás, ressalta-se que a definição da forma de seleção do parceiro deve ser realizada nesse momento e, por isso, depende intrinsecamente de uma boa identificação da necessidade e definição da solução. Os custos devem ser estimados corretamente, consideradas as eventuais prorrogações, e a definição da modalidade licitatória, nos termos do art. 23 da Lei n° 8.666/93 ou a escolha pela dispensa em razão do valor, com fulcro no art. 24, incs. I ou II (a depender do objeto) deve ser realizada com base nesses parâmetros.
Quando se verifica que a Administração não estimou adequadamente suas despesas e realizou indevidamente a contratação por dispensa em razão do valor ou utilizou-se de modalidade diversa da adequada, fala-se em fracionamento indevido de despesas, conduta considerada irregular e passível de responsabilização.
Nessa esteira, é o posicionamento do Tribunal de Contas da União em Resenha de Jurisprudência disponível em seu sítio oficial: “A ausência de realização de processo licitatório para contratações ou aquisições de mesma natureza, em idêntico exercício, cujos valores globais excedam o limite legal previsto para dispensa de licitação, demonstra falta de planejamento e implica fuga ao procedimento licitatório e fracionamento ilegal da despesa”.[2]
Mas, e nos casos em que a necessidade for superveniente e imprevisível? Remanesce a vedação de utilização da dispensa por valor ou de modalidade de licitação diversa da que seria originalmente adotada?
É possível defender que não. Nos casos em que restar comprovado que a necessidade é superveniente à contratação efetuada por dispensa em razão do valor, ou a realização da licitação em modalidade diversa, a nova contratação poderá ser fundamentada no art. 24, inc. I ou II (a depender do objeto) ou poderá realizar-se nova licitação considerando o valor dessa nova despesa sem que reste caracterizado o fracionamento indevido ou burla ao procedimento licitatório.
Nessa linha já se posicionou o Tribunal de Contas de Santa Catarina em resposta a um de seus consulentes: “A unidade gestora deve prever as contratações que realizará no curso do exercício, sendo que as despesas decorrentes de objetos não usuais ou imprevisíveis podem ser contratadas através de dispensa de licitação, desde que não ultrapassem o valor previsto no art. 24, I e II, da Lei Federal 8.666/93″.[3] (Grifou-se)
Assim, tem-se que o dever de planejar só se impõe às necessidades passíveis de previsão. Desse modo, nos casos em que a demanda for superveniente e imprevisível, a Administração poderá promover nova licitação ou realizar a contratação valendo-se da dispensa em razão do valor se o custo da despesa não ultrapassar os limites legais.
Destarte, tem-se que a hipótese de não computar valores para fins de definição da modalidade licitatória ou da dispensa por valor decorre de situações extraordinárias e, repita-se, imprevisíveis. Pois, se restar comprovado que houve falha no planejamento da contratação, de modo que a despesa pudesse ser prevista de antemão, restará caracterizado o fracionamento de despesas e deverá ser apurada a responsabilidade dos gestores.
[1] Mendes. Renato Geraldo. Lei de Licitações e Contratos Anotada. 9 ed. Curitiba: Zênite. 2012. p. 90.
[2] Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/pls/apex/f?p=175:11:1001755882593301::NO::P11_NO_SELECIONADO,P11_TELA_ORIGEM,P11_ORIGEM:0_1_407_69_36,LOGICA,0>. Acesso em: 02 jul. 2015.