O TCU tem entendido não ser possível exigir certidão negativa de infrações trabalhistas. Diante disso, como cumprir o disposto no inc. V do art. 29 da Lei nº 8.666/93?
De acordo com a Constituição da República (art. 37, inc. XXI), “ressalvados os casos especificados na legislação”, todas as contratações realizadas pela Administração deverão ser precedidas de procedimento licitatório. Na realização desse procedimento, somente serão permitidas “exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”.
Em respeito a essa exigência, a Lei nº 8.666/93 prescreve as exigências indispensáveis à comprovação da idoneidade do licitante e de sua capacidade para executar o objeto licitado. Trata-se do rol de exigências habilitatórias, definido nos arts. 27 a 31 da Lei de Licitações. A exigência de qualquer requisito em desacordo com esse rol estabelecido pela Lei de Licitações é considerada ilegal e incompatível com a indispensabilidade prevista na Constituição.
Não por outra razão, no Acórdão nº 3.148/2014 – Plenário, o Tribunal de Contas da União entendeu que a exigência de certidão de infrações trabalhistas constitui irregularidade.
Inclusive, essa tem sido a orientação adotada pela Corte de Contas em relação à exigência de apresentação de certidão negativa de ilícitos trabalhistas, justamente por não estar contemplada no rol delineado pelos arts. 27 a 31 da Lei nº 8.666/93 c/c o art. 37, inc. XXI, da Constituição da República.1
Registre-se, contudo, que não se deve estabelecer confusão entre a certidão negativa de infrações trabalhistas e a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas (CNDT).
Enquanto a certidão negativa de infrações trabalhistas informa a ausência de constatação de ilícitos trabalhistas cometidos pela licitante, com base no exercício do poder de polícia conferido aos órgãos de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, a CNDT atesta a inexistência de débitos inadimplidos perante a Justiça do Trabalho.
A CNDT foi instituída pela Lei nº 12.440/11, que acrescentou o Título VII-A à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Segundo essa nova disciplina incluída na CLT, a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas será expedida, gratuita e eletronicamente, para comprovar a inexistência de débitos inadimplidos perante a Justiça do Trabalho, considerando todos os estabelecimentos, agências e filiais da pessoa interessada e terá prazo de validade de 180 dias, contado da data de sua emissão.2
Caso se verifique, em nome do interessado, a existência de débitos garantidos por penhora suficiente ou com exigibilidade suspensa, será expedida Certidão Positiva de Débitos Trabalhistas com efeitos negativos.
Além de criar a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas, a Lei nº 12.440/11 também alterou a Lei nº 8.666/93, que, a partir do início da vigência da nova Lei, passou a exigir essa Certidão como condição para habilitação das licitantes interessadas nos procedimentos licitatórios.
Essa constatação se forma a partir do disposto no art. 27, inc. IV, c/c art. 29, inc. V, ambos da Lei nº 8.666/93:
Art. 27 Para a habilitação nas licitações exigir-se-á dos interessados, exclusivamente, documentação relativa a:
(…)
IV – regularidade fiscal e trabalhista; (Redação dada pela Lei nº 12.440, de 07.07.2011)
Art. 29 A documentação relativa à regularidade fiscal e trabalhista, conforme o caso, consistirá em: (Redação dada pela Lei nº 12.440, de 07.07.2011)
(…)
V – prova de inexistência de débitos inadimplidos perante a Justiça do Trabalho, mediante a apresentação de certidão negativa, nos termos do Título VII-A da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. (Incluído pela Lei nº 12.440, de 07.07.2011)
Em síntese, conclui-se que o Tribunal de Contas da União tem entendimento pacificado no sentido de não ser possível exigir certidão negativa de infrações trabalhistas como requisito de habilitação nas licitações, dada manifesta falta de previsão legal nesse sentido.
Para fins de habilitação nos procedimentos licitatórios, a prova de inexistência de débitos inadimplidos perante a Justiça do Trabalho, conforme previsto pelo inc. V do art. 29 da Lei nº 8.666/93, é feita por meio da CNDT, instituída pela Lei nº 12.440/11.
REFERÊNCIAS
1 Entre outros, ver TCU: Acórdão nº 112/2007 – Plenário; Decisão nº 792/2002 – Plenário; Decisão nº 1.140/2002 – Plenário; Acórdão nº 2.521/2003 – 1ª Câmara; Acórdão nº 2.783/2003 – 1ª Câmara; Acórdão nº 1.355/2004 – Plenário; Acórdão nº 36/2005 – Plenário; Acórdão nº 697/2006 – Plenário; Acórdão nº 1.844/2006 – 1ª Câmara; Acórdão nº 1.979/2006 – Plenário.
2 Para obter essa Certidão, não poderá constar em nome da licitante: I – o inadimplemento de obrigações estabelecidas em sentença condenatória transitada em julgado proferida pela Justiça do Trabalho ou em acordos judiciais trabalhistas, inclusive no concernente a recolhimentos previdenciários, honorários, custas, emolumentos ou recolhimentos determinados em lei; ou II – o inadimplemento de obrigações decorrentes de execução de acordos firmados perante o Ministério Público do Trabalho ou comissão de conciliação prévia.
Nota: Esse material foi originalmente publicado na Revista Zênite – Informativo de Licitações e Contratos (ILC), Curitiba: Zênite, n. 253, p. 298, mar. 2015, seção Perguntas e Respostas. A Revista Zênite e a Web Zênite Licitações e Contratos tratam mensalmente nas seções Orientação Prática e Perguntas e Respostas das dúvidas mais frequentes e polêmicas referentes à contratação pública. Acesse www.zenite.com.br e conheça essas e outras Soluções Zênite.