A exigência de transparência nas estatais configura um dos pilares da ideia de governança contida no art. 6º da Lei 13.303/16 e vai muito além da noção de publicidade que usualmente temos quando pensamos na Administração Pública. A referida Lei traz inovações substanciais nesse sentido.
A questão central sobre esse tema é perceber que a transparência não é um dever passivo, em que a empresa informa algo apenas se for perguntada a respeito disso. A transparência nas estatais é um dever ativo, que envolve a necessidade de comunicar, de modo institucional e regular, todas as informações relevantes acerca do funcionamento dessas empresas. É um dever multifacetado. O dever de transparência impõe diversos desses deveres de comunicação ativa.
Em primeiro lugar, a transparência passa pela coerência e fidelidade das informações de natureza contábil. Segundo o art. 7º da Lei, os padrões a serem utilizados são os mesmos das empresas de capital aberto. Inclusive, exigindo-se que as demonstrações sejam auditadas por empresas independentes.
A Lei investiu, portanto, em padrões de primeira linha no que se refere às demonstrações contábeis das estatais. A ideia é: uma empresa que é controlada pelo Estado deve ter informações bastante precisas acerca do seu patrimônio. Se no mundo das empresas privadas isso diz respeito aos investidores, nas estatais isso é fundamental ao próprio controle social. Ninguém controla aquilo que não conhece.
Outro ponto é a carta anual prevista. Trata-se de um documento revolucionário. Ele exige, em termos simples, que a empresa fixe seu plano de voo para um determinado período de tempo. Isso impede que a empresa seja conduzida sob o viés estritamente político. Cuida-se de estabelecer um compromisso entre a gestão técnica e os objetivos sociais da empresa. Uma das coisas que precisamos combater no regime das estatais é a apropriação política delas. Aquela coisa de usar a máquina pública para fins eleitorais deve ser combatida com firmeza. A carta é um instrumento poderoso nesse sentido.
Outro aspecto que se conecta com a ideia de transparência é a clareza dos objetivos estatutários. Os estatutos devem refletir fielmente os objetivos da empresa. Eles conectam a diretriz da lei que autorizou a criação da estatal com a sua gestão. Há um progressivo processo de tornar cada vez mais concreto o objetivo abstrato previsto na Lei. Isso tudo milita contra a possibilidade de conduzir de maneira política a estatal. Quanto mais específicos forem os objetivos, menor será a possibilidade de captura política.
A publicidade na gestão é também elemento integrante da ideia de transparência. O que se exige é uma política de divulgação. Perceba-se que isso é bem diferente do que nós pensamos quando falamos de “princípio da publicidade” na Administração. Publicidade usualmente é compreendida como o dever de dar informações quando elas são solicitadas. Aqui é diferente. Exige-se que as informações sejam levadas ativamente até a sociedade. Daí que uma política de divulgação não consiste em apenas deixar a informação disponível, mas sim em fazer ela chegar a quem possa ter interesse no tema. Toda informação relevante deve ser divulgada. Somente se admite limitação no que se refere às informações estratégicas, que possam impactar na estratégia de negócios.
O tema da transparência assume especial relevo quando há acionistas privados. Nesse caso, tem particular relevância a necessidade de contar com protocolos claros de inter-relacionamento público-privado. Uma das coisas mais importantes é ter uma política clara de distribuição de dividendos, em que esteja evidente para os investidores privados como o resultado econômico da empresa será dividido.
Como visto, o tema é rico. Pensar em transparência nas estatais é fundamental para que elas sejam instrumentos de concretização do interesse público. Parece utópico, mas se não fizermos a nossa parte, continuaremos vivendo no país em que a realidade é muito pior do que as leis sugerem.