Nova Lei de Licitações: regras de transição do velho para o novo regime

Nova Lei de Licitações

Em 30 de dezembro serão (ou foram, a depender da data da leitura do texto) revogadas a Lei nº 8.666/93 e a Lei nº 10.520/02. É o que determina o art. 193 da Lei nº 14.133/21:

Art. 193. Revogam-se:

II – em 30 de dezembro de 2023:

a) a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993;

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b) a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002; e

c) os arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011.

A partir de janeiro de 2024 as licitações e contratações públicas serão regidas pela Lei nº 14.133/21. Contudo, as normas que serão (ou foram) revogadas, vão produzir efeitos jurídicos e reger as contratações públicas por alguns anos, de acordo com o regime legal de transição.

A Lei nº 14.133/21 contempla um expresso regime de transição que deverá ser observado corretamente pela Administração Pública. Este regime de transição está contemplado nos artigos 190 e 191 da Lei.

Art. 190. O contrato cujo instrumento tenha sido assinado antes da entrada em vigor desta Lei continuará a ser regido de acordo com as regras previstas na legislação revogada.

Art. 191. Até o decurso do prazo de que trata o inciso II do caput do art. 193, a Administração poderá optar por licitar ou contratar diretamente de acordo com esta Lei ou de acordo com as leis citadas no referido inciso, e a opção escolhida deverá ser indicada expressamente no edital ou no aviso ou instrumento de contratação direta, vedada a aplicação combinada desta Lei com as citadas no referido inciso.

Parágrafo único. Na hipótese do caput deste artigo, se a Administração optar por licitar de acordo com as leis citadas no inciso II do caput do art. 193 desta Lei, o contrato respectivo será regido pelas regras nelas previstas durante toda a sua vigência.

De acordo com o texto legal, pode-se deduzir algumas regras específicas de transição:

1ª regra – contratos celebrados com fundamento na Lei nº 8.666/93

Os contratos derivados de licitação ou de processo de contratação direta fundamentados na Lei nº 8.666/93 ou na Lei nº 10.520/02 serão regidos até sua extinção por estas leis. A Lei nº 14.133/21 confere à Lei nº 8.666/93 e à Lei nº 10.520/02 efeitos de ultratividade, que é instituto jurídico pelo qual uma norma pode produzir efeitos jurídicos mesmo depois de revogada. A regra contida no art. 190 da nova Lei de Licitações se assenta, também, no princípio do “tempus regit actum” – pelo qual uma relação jurídica será regida pelas regras jurídicas que vigoravam quando foi estabelecida.

Tome-se por exemplo um contrato de prestação de serviços contínuos celebrado em março de 2021 (antes da entrada em vigência da Lei nº 14.133/21). Este contrato foi celebrado com fundamento na Lei nº 8.666/93. Ao longo de toda a vigência contratual a relação jurídica será regulada pelas normas da Lei nº 8.666/93 – alterações contratuais, prorrogações ou renovações contratuais, recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, entre outras intercorrências fático-jurídicas, permanecerão submetidas ao regime da Lei revogada até que ocorra a extinção do contrato.

2ª regra – licitações ou processos de contratação direta iniciados até 29 de dezembro de 2023

Até o dia 29 de dezembro de 2023 podem ser publicados editais de licitação, ou autorizados processos de contratação direta – dispensa ou inexigibilidade – com fundamento na Lei nº 8.666/93 ou na Lei nº 10.520/02. Publicado o edital ou autorizado o processo de contratação direta até esta data, o processo licitatório ou de contratação direta poderão ter seu curso regular mesmo após a revogação das leis referidas. Não há prazo legal para a conclusão da licitação ou efetivação da contratação direta, o que pode ocorrer mesmo após o transcurso de largo espaço de tempo após 30 de dezembro de 2023.

Os contratos derivados destas licitações ou processos de contratação direta serão celebrados e regidos, até a sua extinção, pelas regras da Lei nº 8.666/93 ou da Lei nº 10.520/02, no que couber. Assim, alterações contratuais, prorrogações ou renovações contratuais, recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, entre outras intercorrências fático-jurídicas, permanecerão submetidas ao regime da Lei revogada até que ocorra a extinção do contrato.

3ª regra – atas de registro de preços celebradas com base na Lei nº 8.666/93 ou na Lei nº 10.520/02

 As atas de registro de preços celebradas com base na Lei nº 8.666/93 ou na Lei nº 10.520/02 serão regidas por estas normas, mesmo após 30 de dezembro de 2023.

Estas atas, de acordo com o regime da Lei nº 8.666/93 podem ter vigência pelo prazo improrrogável de até 1 ano. Por hipótese, suponha-se um edital de licitação para registro de preços, com base na Lei nº 8.666/93, publicado até 29 de dezembro de 2023, cuja licitação se encerre em março de 2024. Caso a ata seja celebrada no mesmo mês, terá vigência até março de 2025. Até março de 2025 a referida ata de registro de preços poderá gerar múltiplos contratos. Todos serão celebrados e regidos pela Lei nº 8.666/93 até sua extinção. Assim, ainda por hipótese, um contrato de prestação de serviços contínuos – limpeza – derivado desta ata, e celebrado em março de 2025, poderá ter vigência prorrogada por até 60 meses (no caso, até março de 2030).

4ª regra – adesão a atas de registro de preços após a revogação da Lei nº 8.666/93

Em homenagem aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade, da eficiência, da economicidade e do interesse público não há óbice para que sejam aceitas adesões a ata de registro de preços celebradas com fundamento na Lei nº 8.666/93, mesmo após a sua revogação. A Lei nº 14.133/21 não contém regramento de transição expresso para o instituto do registro de preços. Esta omissão deve ser suprida por interpretação inteligente da Lei. A nova Lei faz alusão expressa a que as licitações e os contratos celebrados com base na Lei nº 8.666/93 serão regidos por esta lei, até sua extinção (dos contratos). Ao instituto do registro de preços se aplicam as regras de transição expressamente entabuladas para reger licitações e contratos fundamentados na Lei nº 8.666/93.

Desta feita, uma ata de registro de preços celebrada com fundamento na Lei nº 8.666/93 terá vigência plena, até sua extinção, mesmo após a revogação desta Lei. Por vigência plena se deve entender a possibilidade de adesões (caronas) nos limites estabelecidos pelas normas de regência (por exemplo, Decreto Federal nº 7.892/13).

Aliás, esta foi a opção normativa prevista no Decreto Federal nº 11.462/2023:

Art. 38.  Os processos licitatórios e as contratações autuados e instruídos com a opção expressa de ter como fundamento a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, ou a Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011, além do Decreto nº 7.892, de 23 de janeiro de 2013, serão por eles regidos, desde que:

I – a publicação do edital ou do ato autorizativo da contratação direta ocorra até 29 de dezembro de 2023; e

II – a opção escolhida seja expressamente indicada no edital ou no ato autorizativo da contratação direta.

§ 1º Os contratos, ou instrumentos equivalentes, e as atas de registro de preços firmados em decorrência do disposto no caput serão regidos, durante toda a sua vigência, pela norma que fundamentou a sua contratação.

§ 2º As atas de registro de preços regidas pelo Decreto nº 7.892, de 2013, durante suas vigências, poderão ser utilizadas por qualquer órgão ou entidade da Administração Pública federal, municipal, distrital ou estadual que não tenha participado do certame licitatório, mediante anuência do órgão gerenciador, observados os limites previstos no referido Decreto.

5ª regra – casos que exijam republicação do instrumento convocatório após a revogação da Lei nº 8.666/93 e da Lei nº 10.520/02

Situação controvertida é a de licitação fundada na Lei nº 8.666/93 ou na Lei nº 10.520/02, que teve o instrumento convocatório publicado até 29 de dezembro de 2023, mas que, por força de acolhimento de pedido de esclarecimento ou de impugnação, forem realizadas modificações substanciais de conteúdo, que afetem ou influenciem a elaboração das propostas. Neste caso, a Lei exige que o instrumento convocatório seja objeto de nova publicação, com reabertura de todos os prazos de publicidade.

Seria possível aproveitar este processo licitatório? Ou, tendo em vista que a nova publicação do edital se daria após a revogação da Lei nº 8.666/93 ou da Lei nº 10.520/02, seria preciso instaurar novo processo licitatório fundado na Lei nº 14.133/21?

Não parece razoável, e parece violar princípios basilares que regem a Administração Pública, sustentar que este processo licitatório não poderia mais ser aproveitado. O interesse público pode sofrer fortes gravames ou prejuízos decorrentes do desfazimento desta licitação.

Assim, é perfeitamente defensável, em observância aos princípios da economicidade, eficiência, celeridade, razoabilidade e do interesse público, a interpretação no sentido de que o processo licitatório pode ser aproveitado, ainda que demande nova publicação do edital após a revogação das Leis nº 8666/93 e nº 10.520/02. O fundamental é que a primeira publicação do instrumento convocatório seja efetivada até 29 de dezembro de 2023.

Acompanhe também novidades sobre licitações e contratos pelo instagram @joseanacleto.abduch.

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