Foi apresentada a seguinte indagação para análise da Zênite:
“Uma empresa não licitante solicitou à Administração cópias dos documentos de credenciamento, habilitação e proposta comercial da empresa vencedora do certame, além da cópia da ata da sessão.
A Administração tem o dever ou a faculdade de fornecer cópias de toda e qualquer documentação integrante do processo licitatório a terceiros estranhos ao procedimento?”.
Um dos princípios constitucionais que rege a Administração Pública é o da publicidade (art. 37, caput, da CF), que confere aos cidadãos o direito de acesso a informações, assegurando efeitos externos aos atos e contratos administrativos, além de propiciar conhecimento e controle pelos interessados diretos, bem como pelo povo em geral.
Sobre o acesso às informações da licitação, o art. 63 da Lei de Licitações assegura “a qualquer licitante o conhecimento dos termos do contrato e do respectivo processo licitatório e, a qualquer interessado, a obtenção de cópia autenticada, mediante o pagamento dos emolumentos devidos”.
Esse dispositivo garante a qualquer cidadão o direito de conhecer e obter cópias autenticadas do procedimento licitatório, sem a necessidade de alegar qualquer motivo ou caracterizar o preenchimento de qualquer outra situação. A única condição é o pagamento dos emolumentos devidos, assim entendidos os efetivos custos das cópias reprográficas, sendo vedada a obtenção de lucro em favor da Administração.1
Do mesmo modo e com a mesma finalidade, a Lei nº 12.527/11, que regulamenta o acesso à informação, impõe aos órgãos públicos integrantes da Administração direta dos Poderes Executivo, Legislativo, incluindo as cortes de contas, e Judiciário e do Ministério Público que integram a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, bem como às autarquias, às fundações públicas, às empresas públicas, às sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios (art. 1º), o dever de observar o disposto no seu art. 7º, inc. VI:
Art. 7º O acesso à informação de que trata esta Lei compreende, entre outros, os direitos de obter:
(…)
VI – informação pertinente à administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação, contratos administrativos;2
A Lei nº 12.527/11 também assegura a qualquer interessado apresentar pedido de acesso a informações, devendo apenas o pedido conter a identificação do requerente e a especificação da informação requerida, sendo vedadas quaisquer exigências relativas aos motivos determinantes da solicitação de informações de interesse público.
Como regra, o órgão ou a entidade público deverá autorizar ou conceder o acesso imediato à informação disponível. Apenas quando não for possível conceder o acesso imediato, o órgão ou a entidade que receber o pedido terá o prazo de até 20 dias para atendê-lo, podendo ser prorrogado por mais dez dias, mediante justificativa expressa.
O direito de acesso e conhecimento dos termos do contrato e do respectivo processo licitatório estende-se a qualquer pessoa e, ressalvadas as informações sigilosas, assim entendidas aquelas submetidas temporariamente à restrição de acesso público em razão de sua imprescindibilidade para a segurança da sociedade e do Estado, alcança todos os documentos e peças que instruem e formalizam o processo de contratação, desde a sua fase interna (antes da divulgação do edital) até a fase contratual, na qual ocorre a execução do contrato, seu recebimento, liquidação e pagamento da despesa.
Sob esse enfoque, é expressamente proibido à Administração Pública ocultar informações e negar o fornecimento de cópias dos autos dos processos administrativos de contratação pública aos licitantes ou a qualquer cidadão interessado.
Seguindo essa mesma diretriz, formam-se as anotações de Renato Geraldo Mendes ao destacar precedentes do Poder Judiciário:
3841 – Contratação pública – Contrato – Fornecimento de cópia dos autos – Planilhas – Acesso – Condição necessária – TRF 4ª Região
“A falta de acesso às planilhas de composição de custos da empresa vencedora impede a fiscalização do cumprimento do edital”. (TRF 4ª Região, Agravo de Instrumento nº 2005.04.01.020093-7/PR, DJ de 29.03.2006.)
3842 – Contratação pública – Princípio – Publicidade – Informação – Direito dos licitantes e cidadãos – Obrigatoriedade – TJ/SP
Todos têm direito a receber informações de atos da Administração, salvo aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, assim decidiu o TJ/SP: “Assim, a lei manda que o procedimento de licitação seja acessível a qualquer cidadão, sendo inadmissível que a Administração vede esse acesso por conta da finalidade que o administrado quer dar às informações nele contidas, desde que essa finalidade não contrarie a lei ou a segurança do Estado”. (TJ/SP, Apelação Cível nº 5506695700, Rel. Angelo Amaral Netto, j. em 14.02.2008.)3
À luz das considerações acima, seja qual for o status da pessoa interessada (licitantes ou estranhos ao procedimento), por força do princípio da publicidade previsto na Constituição Federal e de sua regulamentação legal constante da Lei nº 8.666/93 e da Lei nº 12.527/11, é dever, e não faculdade, da Administração fornecer cópias de toda e qualquer documentação integrante do processo licitatório. Apenas diante de situação excepcional, quando o teor dos documentos esteja protegido pelo sigilo, na forma da Lei nº 12.527/11, será possível à Administração restringir o amplo acesso a essas informações.
REFERÊNCIAS
1 Adotou-se nesse dispositivo a mesma inteligência consignada pela Lei nº 8.666/93 em seu art. 32, § 5º. Sobre o assunto, comenta Renato Geraldo Mendes: “2424 – Contratação pública – Licitação – Exigência de recolhimento de taxas e valores – Vedação legal – Direito líquido e certo – Mandado de segurança – Renato Geraldo Mendes: Em razão do disposto no § 5º do art. 32 da Lei nº 8.666/93, o licitante tem o inquestionável direito de se opor à exigência de recolhimento de taxas, emolumentos ou valores a título de habilitação, salvo o caso específico de alienação de bens por meio de leilão, tal como previsto no art. 18 da Lei nº 8.666/93. O mencionado § 5º do art. 32 cria para o interessado o direito de se opor à cobrança do edital quando o valor não se limitar ao custo da sua reprodução ou cópia. Se o valor a ser cobrado não for compatível com o custo da reprodução gráfica (fotocópia), caberá ao interessado exercer o seu direito de impugnar o edital. Sendo a impugnação ignorada ou considerada improcedente, será o caso de o interessado utilizar o mandado de segurança, pois o seu direito violado é líquido e certo. A fim de evitar esse tipo de problema, tem a Administração Pública, por meio de seus agentes, o dever de observar as condições legais definidas em relação à cobrança do edital e, assim agindo, evitar discussões desnecessárias, principalmente no Judiciário”. (MENDES, Renato Geraldo. LeiAnotada.com. Lei nº 8.666/93, nota ao art. 32, § 5º, categoria Doutrina. Disponível em: <http://www.leianotada.com>. Acesso em: 03 jul. 2013.)
2 Também se aplicam as disposições dessa Lei, no que couber, às entidades privadas sem fins lucrativos que recebam, para realização de ações de interesse público, recursos públicos diretamente do orçamento ou mediante subvenções sociais, contrato de gestão, termo de parceria, convênios, acordo, ajustes ou outros instrumentos congêneres (art. 2º).
3 MENDES, Renato Geraldo. LeiAnotada.com. Lei nº 8.666/93, nota ao art. 63, caput, categoria Jurisprudência. Disponível em: <http://www.leianotada.com>. Acesso em: 07 jul. 2013.
Nota: Esse material foi originalmente publicado na Revista Zênite – Informativo de Licitações e Contratos (ILC), Curitiba: Zênite, n. 237, p. 1152-1153, nov. 2013, seção Orientação Prática. A Revista Zênite e a Web Zênite Licitações e Contratos tratam mensalmente nas seções Orientação Prática e Perguntas e Respostas das dúvidas mais frequentes e polêmicas referentes à contratação pública. Acesse www.zenite.com.br e conheça essas e outras Soluções Zênite.