De acordo com o art. 31, inc. I, da Lei de Licitações, a qualificação econômico-financeira dos licitantes será aferida, entre outros documentos, mediante a análise do “balanço patrimonial e demonstrações contábeis do último exercício social, já exigíveis e apresentados na forma da lei, que comprovem a boa situação financeira da empresa, vedada a sua substituição por balancetes ou balanços provisórios, podendo ser atualizado por índices oficiais quando encerrados a mais de 3 (três) meses da data de apresentação da proposta”. (Grifamos.)
Quando se faz alusão à apresentação de balanço patrimonial relativo ao último exercício social, já exigíveis e apresentados na forma da lei, quer-se dizer que a obrigação do licitante consiste em entregar à Administração o balanço que, ao tempo da realização da licitação, já seja devido de acordo com sua lei específica. Inclusive, como visto, a lei expressamente faz alusão à vedação de sua substituição por balancetes ou balanços provisórios.
Nos termos do que dispõe o art. 1.179 do Código Civil, a regra geral vigente tanto para os empresários quanto para as sociedades empresárias é a de que o balanço patrimonial e o de resultado econômico sejam levantados anualmente.
Relativamente às sociedades limitadas, o art. 1.065 do Código Civil determina que o balanço patrimonial deva ser elaborado ao término do exercício social. Contudo, a eficácia desse documento perante terceiros ocorre apenas com sua avaliação pelos sócios da empresa, nos termos do art. 1.078, inc. I, o qual prevê:
Art. 1.078. A assembléia dos sócios deve realizar-se ao menos uma vez por ano, nos quatro meses seguintes à ao (sic) término do exercício social, com o objetivo de:
I – tomar as contas dos administradores e deliberar sobre o balanço patrimonial e o de resultado econômico. (Grifamos.)
Dessa forma, o balanço patrimonial de uma sociedade limitada é exigível somente após a assembleia de sócios que o aprova, a qual deve ocorrer nos quatro meses seguintes ao término do exercício social.
No caso das sociedades anônimas, as disposições constantes da Lei nº 6.404/76 conduzem à mesma conclusão. Segundo o disposto no art. 176 da Lei das Sociedades Anônimas, ao fim de cada exercício social, a diretoria fará elaborar, com base na escrituração mercantil da companhia, entre outras demonstrações financeiras, o balanço patrimonial, que deverá exprimir com clareza a situação do patrimônio da companhia e as mutações ocorridas no exercício.
Quanto ao prazo para a aprovação desse documento, a Lei nº 6.404/76 define:
Art. 132. Anualmente, nos 4 (quatro) primeiros meses seguintes ao término do exercício social, deverá haver 1 (uma) assembléia-geral para:
I – tomar as contas dos administradores, examinar, discutir e votar as demonstrações financeiras; (Grifamos.)
Como a regra aponta para a coincidência do exercício social com o ano civil, iniciando-se, portanto, em janeiro e encerrando-se em dezembro, a rigor, tanto no caso das sociedades limitadas quanto no caso das sociedades anônimas, o balanço patrimonial referente ao exercício de 2015 será exigível apenas a partir de 1º.05.2016.
Demais disso, ao avaliar o balanço patrimonial já exigível na forma da lei, se a Administração identificar que o licitante não atende ao patrimônio líquido exigido na licitação, por exemplo, então, a princípio, impõe-se a inabilitação desse concorrente, não havendo espaço para cogitar sua permanência no certame com base na apresentação de balancetes ou balanços provisórios, haja vista manifesta vedação legal nesse sentido.
O Tribunal de Contas da União compartilha dessa interpretação valendo-se da lição de Marçal Justen Filho:
Acórdão nº 484/2007-Plenário
131. Embora suficientemente coerente a argumentação tecida, faz-se necessária a citação ao posicionamento de Marçal Justen Filho sobre o tema, já que, no exame deste caso concreto, interpretação equivocada poderia ser dada ao trecho ora transcrito:
‘Não se admitem balancetes ou balanços provisórios – que seriam aqueles levantados extra-oficialmente ou para fins especiais. O motivo reside em que esses documentos não gozam da confiabilidade dos balanços de término de exercício. A diferença entre a correção monetária do balanço e o balanço provisório é clara. Com a correção monetária de balanço ocorre simples atualização monetária dos valores constantes no documento elaborado ao final do exercício. Retrata, portanto, a situação existente no último dia do exercício social. O balanço provisório funda-se na situação existente em um dado momento do exercício social, com previsão de que os dados serão posteriormente conciliados e consolidados.’
Embora seja vedado o uso de balancetes para a comprovação de qualificação econômico-financeira, é cogitável, de forma excepcional, que sejam apresentados balanços intermediários, desde que haja previsão legal ou no contrato social. Sobre o tema, a mesma decisão do Tribunal de Contas da União, em citação da doutrina de Marçal Justen Filho:
Acórdão nº 484/2007-Plenário
(…) Por outro lado, não se confunde balanço provisório com balanço intermediário. Aquele consiste em uma avaliação precária, cujo conteúdo não é definitivo. O balanço provisório admite retificação ampla posterior e corresponde a um documento sem maiores efeitos jurídicos. Já o balanço intermediário consiste em documento definitivo, cujo conteúdo retrata a situação empresarial no curso do exercício. A figura do balanço intermediário deverá estar prevista no estatuto ou decorrer de lei. (Grifamos.)
De todo modo, considerando-se que o propósito maior da exigência de balanço patrimonial é verificar se a pessoa a ser contratada encontra-se em situação econômico-financeira que indique capacidade para executar o contrato, torna-se inevitável perceber que, em algumas situações, bastante excepcionais, a apresentação do balanço patrimonial do ano anterior pode ser insuficiente ou inútil para tal averiguação. Lembrando que, na forma do art. 37, inc. XXI, da Constituição Federal, devem ser exigidas condições econômico-financeiras mínimas indispensáveis à escorreita execução do objeto que está sendo licitado. Nesse sentido, retome-se a decisão do Tribunal de Contas da União, pautada na doutrina de Marçal Justen Filho:
(…) ‘Também não há empecilho à licitante fundar sua capacitação econômico-financeira em eventos ocorridos no curso do exercício, não refletidos em demonstrações financeiras anteriores.
Assim, suponha-se que a empresa em situação de alguma precariedade financeira tenha promovido aumento de capital mediante emissão de novas ações. Os novos recursos acarretaram sua capitalização. As demonstrações financeiras do exercício anterior podem conter dados insuficientes para satisfazer os requisitos do edital. É óbvio, porém, que evento superveniente alterou o panorama e deverá ser considerado pela Administração. Isso não é impedido pela vedação à apresentação de balanços provisórios. Quando promove elevação de capital, a nova situação contábil não se retrata em um “balanço provisório”. A provisoriedade do balanço se caracteriza quando inexistir sua aprovação por ato formal da sociedade. É provisório o balanço destinado a ser confirmado posteriormente, o que importa implícita e inafastável ressalva a seus termos. Não será necessário aguardar o término do exercício para levantar novas demonstrações que nada mais farão do que retratar aquilo que já ocorrera definitivamente no âmbito da sociedade.
Pelos mesmos motivos, a sociedade que delibera pela reavaliação de seus ativos também pode invocar os resultados para fins de licitação. Tendo formalmente aprovado a reavaliação, os efeitos se retrataram em balanço que não é provisório.
Idêntico raciocínio se aplica aos casos de reorganização empresarial. Havendo fusão ou incorporação, consideram-se as demonstrações financeiras daí decorrentes.
Pelos motivos expostos, a redução patrimonial também deverá ser considerada imediatamente. Se uma sociedade for submetida à cisão, a redução patrimonial poderá impedir sua participação. A sociedade cindida não poderá invocar demonstrações financeiras de exercício pretérito, atinente à época anterior à realização da cisão.’
132. Tal construção poderia indicar, em análise superficial, tratar-se o demonstrativo apresentado pela Policard de balanço intermediário, condição que, diferentemente do balanço provisório, possibilitaria a habilitação da empresa para os lotes impugnados.
133. Faz-se mister ressaltar, contudo, que o mesmo fragmento estabelece que a ‘figura do balanço intermediário deverá estar prevista no estatuto ou decorrer de lei’. O contrato social da sociedade (Anexo 1, fls. 253 a 258) não traz qualquer menção à elaboração de balanços intermediários. A cláusula 7ª daquele instrumento, parcialmente transcrita abaixo, trata das demonstrações contábeis da empresa.
Um raciocínio semelhante pode ser identificado a partir de publicação da Zênite, em que se sustenta a inviabilidade de inabilitação imediata nos casos em que o licitante não atende aos índices contábeis previstos no edital licitatório (verificados a partir do balanço patrimonial):
A Administração deve prever nos editais de licitação a inabilitação imediata de licitante que não comprovar o atendimento dos índices financeiros exigidos ou há meios de habilitá-lo sem que tal requisito seja cumprido? (…)
Considerando a interpretação conjugada das disposições constantes dos §§ 1º e 2º do art. 31 da Lei de Licitações e em vista do próprio escopo dessas exigências, a aferição da capacidade financeira do licitante pode ocorrer de forma alternativa. Esse raciocínio se ampara na finalidade da exigência de habilitação em questão, cujo objetivo deve limitar-se a aferir se o licitante possui qualificação econômico-financeira suficiente para garantir o adimplemento do futuro contrato.
Assim, cabe ao edital eleger os índices para efeito de exame da qualificação econômico-financeira, mas também deve indicar que, se não atendidos esses índices, a habilitação do licitante ainda será possível, desde que aferida a capacidade econômico-financeira com base em outros requisitos, tais como o capital mínimo, o patrimônio líquido mínimo ou mesmo por meio da prestação de garantias previstas no § 1º do art. 56 da Lei nº 8.666/93. (…)
Em vista dessas considerações, entende-se não ser dado à Administração prever nos editais de licitação a inabilitação imediata de licitante que não comprovar o atendimento dos índices financeiros exigidos, sem facultar a demonstração da capacidade financeira por outros meios previstos.
Nesses termos, entende-se que o emprego de balancetes ou balanços provisórios como meio de aferição da qualificação econômico-financeira de uma empresa não é permitido pela legislação brasileira. O inc. I do art. 31 da Lei nº 8.666/93 veda expressamente essa prática. Portanto, em regra, se o licitante não atende aos requisitos do edital por meio de seu balanço patrimonial, deve ser inabilitado.
De todo modo, é preciso reconhecer situações que excepcionariam a incidência dessa regra, as quais não envolvem o uso de balancetes. Primeiramente, caso haja a previsão legal ou no contrato social da licitante a respeito dos balanços intermediários (cuja diferença em relação aos balanços provisórios e balancetes deve ser observada). Nesse caso, esse documento deve ser aceito. Igualmente constituirá exceção se a sociedade tiver passado por alguma reestruturação societária desde o último exercício financeiro, ou ainda, caso algum outro evento impactante tenha ocorrido. Nesses casos, novamente será possível cogitar a utilização dessas novas informações, devidamente comprovadas, para a aferição da real qualificação econômico-financeira da licitante.
Nota: Esse material foi originalmente publicado na Revista Zênite – Informativo de Licitações e Contratos (ILC), Curitiba: Zênite, n. 263, p. 85, jan. 2016, seção Perguntas e Respostas. A Revista Zênite e a Web Zênite Licitações e Contratos tratam mensalmente nas seções Orientação Prática e Perguntas e Respostas das dúvidas mais frequentes e polêmicas referentes à contratação pública. Acesse www.zenite.com.br e conheça essas e outras Soluções Zênite.